O clima é tenso no seio do MPLA, depois do anúncio pelo seu Bureau Político da realização de um congresso extraordinário do partido em Dezembro deste ano para balanço dos 50 anos de independência e que vai, inevitavelmente, também discutir o “sucessor” do Presidente João Lourenço.
Políticos, sociedade civil, nacionalistas, militantes e politólogos olham com “muita preocupação” para o processo de escolha da figura que substituirá o Presidente João Lourenço na liderança do partido e como candidato a PR, numa altura em que o tempo é escasso para a projecção e afirmação da sua imagem tendo em vista as eleições de 2027.
Para estes, o momento é crítico para o MPLA e o seu líder, que enfrentam grandes desafios da governação e da necessidade de darem uma resposta às promessas da campanha eleitoral no contexto de uma grave crise económica e social.
De acordo com o nacionalista Cardoso Ribeiro Dembo, militante do MPLA, o sucessor do Presidente João Lourenço terá “enormes dificuldades” para se afirmar, dados os problemas de governação do seu antecessor”. “As promessas eleitorais não cumpridas são um obstáculo para ele. Não terá argumentos para convencer a população que atravessa momentos difíceis nos últimos cinco anos”, assinalou. Segundo Ribeiro Dembo, o MPLA deve aproveitar o congresso extraordinário para rever os seus objectivos, sob pena de enfrentar acrescidas dificuldades nas eleições gerais de 2027. “Desde que o País conquistou a paz em 2002, o MPLA mostra poucos sinais de vontade de mudança”, constatou.
Carlos Ribeiro Dembo prevê uma luta de “David e Golias” no seio do MPLA, onde já se nota nos últimos dias, movimentações e jogadas políticas que reflectem o nascimento de uma nova etapa do processo de democracia interna do MPLA. “Já falam de múltiplas candidaturas. Isso é muito bom para um partido que faz este exercício democrático”, notou, sublinhando que, com múltiplas candidaturas, a direcção do partido poderá encontrar uma figura de referência para a cabeça de lista do MPLA nas eleições de 2027.
O vice-presidente da segunda comissão da Assembleia Nacional pela UNITA, Joaquim Nafóia, entende que, em todos os partidos, a concorrência interna é um factor fundamental para resgatar a confiança dos militantes e fortificar a organização. “A democracia no seio do MPLA não passa do papel. Os estatutos prevêem direito de múltiplas candidaturas, mas normalmente não se vê pessoas a candidatarem-se. Os tempos mudaram, os nossos amigos que não gostam de fazer este exercício, são obrigados a fazê-lo”, referiu.
O porta-voz da FNLA, Ndonda Nzinga, diz que o congresso extraordinário do MPLA não deve passar ao lado de temas sensíveis, tais como as eleições autárquicas e a sucessão presidencial. “É um momento de grande desafio para o MPLA que sempre desvalorizou as múltiplas candidaturas.
O MPLA não deve continuar a ser um partido anti-democrático. Cria estatutos mas não os cumpre”, notou, sublinhando que para a FNLA, múltiplas candidaturas não é novidade. “Será um balanço negativo aquele que o MPLA deve fazer no congresso. Passados 22 anos de paz, as pessoas continuam a sofrer, o desemprego aumentou, a pobreza extrema é uma realidade. Será feito um balanço triste”, conclui.
O secretário do Bureau político do MPLA para os Antigos Combatentes e Veteranos de Pátria, Pedro Neto, disse recentemente que as candidaturas no MPLA nunca foram postas em causa. “Desde 1992 que somos um partido democrático por excelência, portanto, as candidaturas nunca foram postas em causa”, referiu, frisando que desde que o militante reúna os requisitos necessários, não há nada que o impeça de candidatar-se.
Para responder a esses enormes desafios (congresso extraordinário e ordinário), o MPLA meteu já em marcha, em todo o País, o processo de assembleias de balanço e renovação de mandatos que diz ter um significado estratégico e profundo porque vai servir para partilhar as principais acções e linhas orientadoras que conduzirão o partido a vencer os desafios político-eleitorais. Esse processo, segundo a direcção central do MPLA, pede o engajamento de todos os militantes para o fortalecimento da vida interna do partido, o reforço da democracia interna, a prestação de contas e deve responder aos principais desafios do contexto actual.
A vice-presidente do MPLA, Luísa Damião, disse que pretendem com estas assembleias “premiar os melhores quadros e militantes, aqueles que são capazes de melhor dirigir e lograr resultados positivos para o partido, no actual contexto”.
O sociólogo António Ramos Salvaterra, entende que a realização destes congressos, o extraordinário este ano e o ordinário em 2026, serão os momentos “mais altos” da organização, onde poderá, pela primeira vez, haver múltiplas candidaturas. “O MPLA foi sempre forte sob a liderança do Presidente José Eduardo dos Santos.
Com a entrada de João Lourenço, foram introduzidas muitas reformas internas e muitos consideram que o MPLA está agora dividido”, disse, salientando que é cada vez mais evidente que este congresso vai determinar a continuação ou não do MPLA no poder. “É hora dos eduardistas e lourencistas estarem unidos, sob pena de caírem na situação da África do Sul, onde o partido no poder há 30 anos não conseguiu formar um Governo sozinho”, aconselhou.
Segundo ele, hoje o partido no poder tem “muitas dificuldades” para mobilizar militantes, sobretudo na capital. “Hoje falar do MPLA nos bairros é um crime, situação que a UNITA enfrentava antes. Isso implica que, desde a assinatura da paz, em 2002, o Governo do MPLA pouco ou nada fez para a estabilidade social”, acrescentou.
Fonte: NJ