Depois de na segunda-feira os deputados terem votado a retirada da nova Lei da Mediação de Seguros dos artigos que permitem aos bancos vender seguros, com efeitos suspensivos, a ARSEG (regulador), as empresas e associações do sector, uniram-se para explicar que é um retrocesso para o País e que estão absolutamente contra esta decisão. A decisão final é na próxima sexta-feira.
De um lado estão os representantes do poder político, do outro está todo o sector segurador, com a ARSEG a assumir a discussão com os deputados na Assembleia Nacional. Em causa está a pretensão de acabar com a possibilidade de os bancos venderem seguros nas suas agências, o que se tivermos em linha de conta a nossa realidade, será um retrocesso para o sector.
“A ARSEG entende que não permitir que os bancos exerçam a actividade de mediação de seguros representaria um retrocesso para o mercado segurador, pois estaríamos a perder uma oportunidade de, mediante um canal particularmente favorável para o efeito, potenciar o crescimento da penetração e densidade do sector”, referiu à imprensa, PCA da instituição.
Cabe acrescentar que Angola tem a mais baixa taxa de penetração de seguros da SADC, cerca de 0,6%, e uma das mais baixas de África e o do mundo. A retirada dos bancos como canal de distribuição, pode fazer baixar mais este valor.
“A comercialização de seguros através dos bancos, actividade que é internacionalmente designada por bancassurance e que existe em todos os países, tem desempenhado um papel fundamental não só no incremento do nível de penetração dos seguros na economia angolana mas também no aumento da literacia financeira dos consumidores”, explica José Araújo, director executivo Associação de Seguradoras de Angola (ASAN).
Para as principais empresas do sector esta medida também será um erro e um retrocesso no desenvolvimento do sector segurador em Angola. Mário Mota Lemos, PCE da ENSA, refere que “esta pretensão não faz sentido nenhum. Os bancos são distribuidores de seguros e na verdade os mediadores não vão disputar o terreno dos bancos. Penso mesmo que os bancos hoje não trabalham os seguros convenientemente, e se for implantado verdadeiramente o conceito bancassurance nas principais instituições, o sector segurador dará um grande salto e será fundamental para todos os operadores de mercado”.
Já para Alexandre Carreira, PCA da Nossa Seguros, “o canal bancário é extremamente importante para o aumento da penetração dos seguros em Angola. Devo realçar que a taxa de penetração dos seguros em Angola é baixa (é inferior a 1%). O bancassurance é um canal de distribuição de seguros afirmado e aceite em todo o mundo. Em Angola não deve ser diferente. As eventuais posturas anti-competitivas por parte dos bancos devem ser combatidas através de legislação, regulamentação e supervisão eficazes”.
Recordar que na passada segunda-feira os deputados em comissão de especialidade votaram por unanimidade a favor da suspensão de três artigos do capítulo I da nova Lei da Mediação de Seguros, que permite aos bancos manter a sua actividade de distribuidores de seguros. O deputado Esteves Hilário do MPLA, citado pela imprensa, referiu que os bancos comerciais ao também exercerem a qualidade de seguradoras cortam a liberdade dos consumidores, por exemplo, na prática, o banco que vende um crédito impõe o seu seguro sem que o cidadão cliente tenha a possibilidade de recorrer à melhor proposta de preço do mercado.
Já a deputada da UNITA, Navita Ngolo considerou que os bancos ao actuarem como seguradoras entram em conflitos de interesses e colocam em causa a gestão de risco, por este facto defende a retirada dos bancos nos negócios dos seguros. Acrescentou que o exercício dos bancos na qualidade de seguradoras retira a igualdade de oportunidades às outras seguradoras que não estejam suportadas por um banco, assim como fomenta a criação de oligopólios.
Falso problema
Para os operadores do sector este é um falso problema, que foi ultrapassado nos outros países com legislação própria para controlar a actividade dos bancos e garantir a livre escolha dos consumidores e uma concorrência salutar com os mediadores, e não com a proibição do exercício de bancassurance. Esta é também a perspectiva do regulador.
“A coexistência harmoniosa entre a banca e os mediadores é crucial para a manutenção da diversidade no mercado e para atender às diversas necessidades dos consumidores”, explica Elmer Serrão, que acrescenta: “Enquanto a banca proporciona soluções amplas, os mediadores acrescentam valor por meio de sua expertise especializada e atendimento personalizado. Esta colaboração estratégica é essencial para promover uma concorrência saudável e garantir opções abrangentes aos segurados, contribuindo assim para o equilíbrio e crescimento sustentável do sector de seguros em Angola. A banca, pela sua capilaridade, tradição e importância transversal aos 3 segmentos do sistema financeiro, possui as condições necessárias para massificar a mediação de seguros por via dos seus balcões, dando penetração aos produtos de seguros e contribuindo dessa forma para uma maior integração financeira.”
José Araújo lembra também que “o potencial conflito de interesses entre os vários canais de distribuição é gerido pelas seguradoras através da adopção de políticas que os ponham em pé de igualdade, nomeadamente em termos da uniformização dos contratos e dos preços, e garantindo que um contrato vendido por outro canal a um cliente que já tenha um corretor ou mediador, venha a ser incluído na sua carteira de seguros.”.
“As eventuais posturas anti-competitivas por parte dos bancos devem ser combatidas através de legislação, regulamentação e supervisão eficazes”, defende Alexandre Carreira, acrescentando que “os bancos não substituem os corretores de seguros pois estes são especialistas e fornecem aconselhamento isento sobre as melhores soluções para os clientes, pelo que os corretores não devem recear a participação dos bancos no mercado dos seguros. Ademais, existem oportunidades de cooperação entre a bancos e os mediadores que poderão contribuir para o desenvolvimento do sector dos seguros. Por isso penso que proibir a participação dos bancos no mercado dos seguros é claramente um recuo para o país.”.
De acordo com a ARSEG, entre as 24 seguradoras que operam no mercado, 12 possuem acordos de bancassurance com os bancos locais, e, nestas 12, 5 são responsáveis por mais de 73% das vendas totais do mercado. A mediação de seguros através dos bancos representou, em 2022, 15,6% da produção total do sector, o que se traduziu, em valores absolutos, em cerca de 48,7 mil milhões de kwanzas, e que gerou para o Estado, a título de imposto de selo, receitas de pouco mais de 487 milhões Kz em 2022.
Resumindo, na próxima sexta-feira, dia 19, os deputados decidem se tiram ou não estes três artigos da nova Lei, acabando assim com a possibilidade de os bancos venderem seguros. Uma decisão que, a acontecer, será contra o entendimento de todos os operadores do mercado.
Fonte: Expansão