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Investigação de perito do Tribunal de Amesterdão conclui que Isabel dos Santos usou ″datas falsas″ para ‘desviar’ 52,6 milhões de euros

A filha do ex-Presidente da República, Isabel dos Santos, realizou actos jurídicos em nome da Sonangol que beneficiaram as suas empresas num “conflito de interesses”. Uma investigação de um perito do Tribunal de Amesterdão concluiu que o alegado “desvio” de 52,6 milhões de euros (ME) da Esperaza, uma participada da Sonangol, se baseou em deliberações com datas “falsas”, pelo que são “nulas”.

A investigação, cujo relatório preliminar foi divulgado na semana passada, concluiu que o alegado “desvio” para empresas de Isabel dos Santos terá sido feito com base em deliberações “nulas”, porque essencialmente terão sido tomadas posteriormente à destituição da empresária do cargo de presidente da Sonangol.

Além disso, segundo o investigador, a empresária e filha do ex-presidente angolano José Eduardo dos Santos, já falecido, realizou actos jurídicos em nome da petrolífera angolana, enquanto desempenhou aquele cargo, que beneficiaram empresas suas, “num óbvio conflito de interesses”, porque ela e o seu marido Sindika Dokolo eram os beneficiários efectivos da Exem, empresa para a qual foi canalizado o montante em questão.

A Esperaza é uma empresa de direito neerlandês, que era à data controlada a 60% pela petrolífera estatal angolana e em 40% pela Exem, empresa detida a 100% por Isabel dos Santos e o seu marido, Sindika Dokolo, que faleceu em 2020. A Esperaza detém 45% da Amorim Energia, que por sua vez é a maior accionista da Galp Energia, com 33,34%.

De acordo com uma queixa apresentada pela Esperaza em Julho deste ano no Tribunal de Amesterdão, a que a Lusa teve acesso, 52,6 ME foram alegadamente “desviados” por Isabel dos Santos em 2017 da ‘holding’ neerlandesa.

A câmara de empresas, secção especial do Tribunal de Recurso de Amesterdão com jurisdição sobre casos de direito empresarial, ordenou em 2020 a investigação às políticas e negócios de direito holandês da Esperaza a partir de 1 de Janeiro de 2017, a pedido da petrolífera angolana Sonangol e da própria Esperaza.

O relatório de investigação do Tribunal, datado de 31 de Outubro deste ano conclui que “as deliberações foram deliberadamente retrodatadas”, ou seja antecipadas relativamente à data em que ocorreram, e “nenhuma das deliberações foi efectivamente assinada em 14 de Novembro de 2017”, lê-se no documento.

“Esta antecipação da data serviu para dar a impressão de que as deliberações foram assinadas antes de [Isabel] dos Santos e [Sarju] Raikundalia [Presidente e administrador da Sonangol, respectivamente] serem destituídos, a 15 de Novembro de 2017, às 13h00”, conclui o relatório, especificando que “todas as assinaturas só foram adicionadas muito depois desta destituição ter sido tornada pública”, alega o investigador no relatório.

Segundo o relatório, uma troca de e-mails com a United em 15 de Novembro de 2017 “mostra que no início da noite de 15 de Novembro de 2017, ainda nada tinha sido decidido sobre questões importantes [o montante dos dividendos, a pessoa do liquidatário, a pessoa do depositário dos livros e registos]”.

Em Dezembro de 2006, a Sonangol vendeu 40% da participação na Esperaza à Exem, que pagou apenas 15% [cerca de 11 milhões de euros] do preço de compra, pois a empresa estatal angolana acordou que os restantes 85% seriam pagos a partir de dividendos futuros da Esperaza.

A Exem foi dispensada das suas obrigações de pagamento do empréstimo, segundo o acordo de pagamento, em 2017, entre a Sonangol e a Exem para efeitos de pagamento desse empréstimo a prestações, em euros e não em kwanzas, incluindo a confirmação da Sonangol, de 09 de Novembro de 2017, no sentido do pagamento, em 13 de Outubro de 2017, de um montante de 11,9 mil milhões de kwanzas.

Em 4 de Janeiro de 2018, a Sonangol reembolsou para a conta da Exem a quantia de 11,9 mil milhões de kwanzas, recebidos em 13 de Outubro de 2017.

O relatório concluiu que partindo-se “do pressuposto assumido em 2017 pela Sonangol e pela Exem de que a aquisição pela Exem em 2006 de uma participação de 40% na Esperaza era uma realidade, o acordo de pagamento, combinado com a concessão de quitação por parte de [Isabel] dos Santos em nome da Sonangol à Exem relativamente aos juros devidos ao abrigo de um empréstimo de fornecedores de 8,98 milhões de euros, era claramente desvantajoso para a Sonangol e vantajoso para a Exem”.

Neste contexto, Isabel dos Santos “realizou actos jurídicos em nome da Sonangol, enquanto ela tinha um óbvio conflito de interesses ao fazê-lo, dado que ela e/ou o seu marido Dokolo eram os UBO [Ultimate Beneficial Owner — Beneficiários Efectivos] da Exem”, adianta o documento.

O acordo de pagamento, segundo o texto, “abriu o caminho para um pagamento de dividendos de 52,6 milhões de euros efectuado pela Esperaza à Exem a 17 de Novembro de 2017”.

O documento realça também que mesmo que Isabel dos Santos não tivesse sido destituída como administradora da Sonangol na altura em que as deliberações dos accionistas foram elaboradas, também não teria sido autorizada a assiná-las porque, Dário Moura Vicente descreve no seu relatório Pericial, “ao votar as três resoluções dos acionistas da Esperaza agiu num flagrante conflito de interesses”.

Isabel dos Santos, acrescenta-se, “beneficiou assim indirectamente da distribuição de dividendos aprovada por essas deliberações e causou um prejuízo financeiro à Sonangol de igual medida, o que conduz necessariamente à caracterização desses actos como uma forma de negociação consigo mesmo e de abuso de poderes representativos”.

“As deliberações dos accionistas são, portanto, nulas porque a Sonangol, acionista maioritária [da Esperaza], não expressou validamente o seu voto por escrito para aceitar estas deliberações”, afirma o relatório.

Quanto à deliberação de distribuir 131,5 milhões de euros em dividendos e à deliberação por escrito e confirmações do conselho de administração da Esperaza Holding B.V. são também “nulas”, conclui o investigador. Por isso, “os pagamentos de dividendos, a 17 de Novembro de 2017, de 67,06 milhões de euros à Sonangol [retenção de 15% de imposto sobre os dividendos] e 52,6 milhões de euros à Exem foram efectuados indevidamente”, conclui.

Fonte: NJ

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