Gabão: Ali Bongo destronado por golpe militar após eleições ″fraudulentas″ – Fronteiras fechadas, Parlamento dissolvido e tropa nas ruas – O fim da “disnatia” Ondimba
Horas depois de terem sido anunciados os resultados eleitorais das eleições que davam a vitória a Ali Bongo, de 64 anos, no poder há 14 anos, viu os militares tirarem-lhe o que as urnas também não lhe tinham dado, tendo a junta que tomou o poder justificado o golpe com a fraude eleitoral generalizada.
Os resultados oficiais apontavam para uma vitória de Ali Bongo, com 64,27 por cento dos votos, numas eleições em que já ninguém acreditava mas permitiam ao Presidente manter-se no poder graças ao apoio das suas Forças Armadas, o que acabou agora com um golpe protagonizada por essas mesmas unidades militares.
Num comunicado lido na televisão gabonesa, uma junta militar anunciou o fim de uma dinastia que governa o Gabão desde 1967, primeiro com Omar Bongo Ondimba nas rédeas do poder em Libreville, até 2009, e depois com o seu filho, Ali, que foi ganhando eleições fortemente contestadas e nas quais já ninguém acreditava.
Doente e em tratamento fora do país, em Marrocos, há vários anos, Ali Bongo manteve-se inamovível do poder apesar de fortemente contestado nas ruas, apoiando-se nas forças que agora lhe tiraram o tapete, alegando precisamente aquilo que tanto a oposição interna como grande parte das organizações internacionais que pugnam pela consolidação democrática, que é a degenerescência das instituições do país, desde logo as que conduzem as eleições.
Esta “junta” militar, que apareceu na televisão gabonesa Gabon 24 em grande número, ladeando o porta-voz que leu o comunicado que dita o fim do regime de Ali Bongo e a mais de cinco décadas de ditadura familiar, anunciou um período de transição para restabelecer a democracia gabonesa, mandou fechar as fronteiras, dissolveu todas as instituições do Estado e prometeu um novo começo para o país.
Algumas agências noticiaram que foram ouvidos tiros em Libreville, especialmente junto ao Palácio Presidencial, embora sejam ainda escassas as informações sobre a eventualidade de parte das forças armadas gabonesas estar ainda ao lado de Ali Bongo.
No comunicado lido pelo oficial é dito claramente que o país está a atravessar uma “crise institucional, política e económica” sem precedentes e que as eleições ficaram muito longe de poderem ser consideradas minimamente credíveis e democráticas.
Este golpe, adianta o documento, tem como objectivo “defender a paz e acabar com o regime” que é substituído de forma transitória, embora sem prazo definido, pelo Comité para a Transição e Restauração das Instituições (CTRI).
Nas eleições de 26 de Agosto, cujos resultados foram anunciados na terça-feira, o candidato da oposição, Ondo Ossa, obteve apenas 33, 7% dos votos, o que deixou uma maré de indignação varrer o país, especialmente pelo recolher obrigatório imposto durante a campanha e a interrupção da internet, à qual as Forças Armadas não ficaram indiferentes.
Claramente cansados do abuso de poder de Bongo, os militares intervieram e isso resultou no golpe que agora acaba com mais de meio século de poder ditatorial dinástico em Libreville, começado em 1967.
O pai de Ali, Omar Bongo Ondimba sucedeu a Léon M’ba, o primeiro Presidente do país e líder do regime de partido único, governando até 2009, quando morreu de doença, tendo sido eleito três vezes, após a abertura ao multipartidarismo, em 1991, embora sempre com fortes suspeitas de fraude eleitoral em 1993, 1998 e 2005.
Entalado entre a Guiné Equatorial, os Camarões e a República do Congo, o Gabão tem marcado uma posição na cena internacional pela forma como se tem comprometido com a causa ambiental, especialmente na defesa das áreas essenciais para espécies como o gorila e o chimpanzé, além de um forte investimento na protecção das suas reservas marinhas, que estão entre as mais importantes do mundo.
Uma das mais referenciadas iniciaivas ambientalistas de Ali Bongo é a sua forte resistência às companhias petrolíferas que pressionam há largos anos para obterem autorização de exploração on shore, coincidindo essas zonas com as luxuriantes reservas e parques naturais, essencialmente abrangendo a floresta tropical, habitat de dezenas de espécies protegidas, como, além do gorila e do chimpanzé, os pangolins, felinos únicos ou o elefante da floresta…
Uma das questões em cima da mesa com este golpe militar é se a dimensão internacional conquistada pelo Gabão pela sua aposta na defesa da natureza e da floresta tropical, fortemente ameaçadas nos países vizinhos, entre os quais está Angola, com a sua província de Cabinda, está agora em risco com a chegada do CTRI ao poder.
Outra dúvida que não foi ainda esclarecida é se este golpe militar tem alguma ligação aos que desde 2020 têm varrido a África Ocidental, como o da Guiné Conacri, Mali, Burquia Faso ou mesmo no Níger e no Sudão.
E também não se sabe ainda se este golpe pode ter alguma influência nos regimes próximos em que homens como Denis Sessou-Nguesso, na República do Congo, e Teodoro Obiang Nguema, na Guiné Equatorial.
Fonte: NJ