O relatório analisa amostras da plataforma Jobartis. Inquiriu mais de 6 mil candidatos cadastrados na plataforma e concluiu que há muito mais candidatos do que vagas em empresas. O mercado está mais apto a recrutar para áreas de vendas e comércio do que para áreas técnicas.
Por cada dez licenciados ou pós-graduados no País entre 2020 e 2023 houve apenas três vagas de emprego no mercado formal, de acordo com o Relatório Anual de Emprego elaborado pelo Centro de Investigação Económica da Universidade Lusíada de Angola (CIVENSTEC) e o portal de emprego Jobartis.
O relatório, que é pioneiro na análise do panorama do emprego em Angola, examinou os dados do maior portal de emprego de Angola, Jobartis, dos últimos quatro anos (2020-2023) e avaliou questões o nível de escolaridade dos candidatos, as áreas que mais procuram colaboradores e até o salário médio praticado por tipo de empresas. Para o estudo foram inquiridos mais de 6 mil candidatos, numa base de dados de 166.041 pessoas cadastradas na plataforma online.
No capítulo em que o relatório analisa o emprego por nível de escolaridade, revela que há um gap enorme entre a procura e a oferta de empregos ao nível das licenciaturas e das pós-graduações, um indicador que é fortemente influenciado pela informalidade da economia, já que no País, de acordo com dados do INE, há pouco mais de 2,3 milhões de empregos formais. Neste período, o acumulado de oferta/candidatos com licenciatura ou pós-graduação a empregos foi de 31.318 para apenas 9.709 vagas. Ou seja, a oferta cobria apenas 31% da oferta.
Se olharmos para o ano passado, que são os dados mais recentes e que o relatório também ilustra, os números são ainda mais negativos. Isto porque na plataforma haviam 8.177 candidatos licenciados ou pós-graduados, mas existiam apenas 2.166 vagas disponibilizadas pelas empresas que estavam à procura de colaboradores. Ou seja, as vagas garantiam apenas 26,7% da oferta de candidatos.
Esta cobertura é ligeiramente mais alta em relação à cobertura global do emprego no País, que o relatório fixa em 20%, sendo que 80% dos angolanos economicamente activos não encontram emprego na plataforma, o que também demonstra o nível de informalidade da economia nacional.
O resultado da amostra analisada está alinhado com a incapacidade da economia gerar emprego ao ritmo do crescimento da mão-de-obra, no País. Isto porque Angola tem passado por ciclos de baixo crescimento económico, e até recessões (2016 a 2020), enquanto a sua população cresce a um ritmo anual de 3,1%. Quando a população cresce acima do Produto Interno Bruto (PIB) significa que o País está a criar cada vez mais população pobre.
De acordo com o economista Heitor de Carvalho, o País tem pessoas suficientes para toda a procura de emprego por parte das empresas, o que falta verdadeiramente é existir empresas que criem emprego. “A solução para Angola não passa necessariamente na aposta de programas de formação nem programas de emprego, mas sim a criação de mais empresas, com a melhoria de ambiente de negócios no País”, explica o docente universitário.
Para o economista, a criação de postos de trabalhos em países subdesenvolvidos passa, por exemplo, por deixar que os sectores imobiliários e fundiários, que são “importantíssimas fontes de capital, funcionem, já que são sectores de mão-de-obra intensiva”. E acrescentou: “mas também temos de mudar a cultura de querermos ser todos doutores. Temos de tornar o nosso ensino mais técnico. No mundo há, cada vez mais, procura pela formação média com uma forte componente técnica agregada e licenciados que tenham um percurso técnico no decorrer da formação e não para a formação superior de modo geral que é muito teórica no nosso caso”, alertou.
O relatório revela, por outro lado, que os candidatos com a escolaridade até ao nível médio têm mais oferta de emprego. Isto porque ao longo destes quatro anos por cada 10 candidatos com o ensino médio haviam cinco vagas de emprego na plataforma da Jobartis. Esta tendência, apesar de ainda ser deficitária do lado da oferta de emprego disponibilizada pelas empresas, ainda assim reforça a propensão de a economia estar mais apta para recrutar candidatos com este nível de ensino, como acontece um pouco por todo mundo. Até porque a maioria das empresas angolanas estão no sector do comércio, muitas delas pequenas lojas de porta aberta ao público e, por isso, procuram por colaboradores com ensino médio e abaixo disso.
Para o nível de escolaridade primário, que incluem pessoas que não concluíram o ensino médio, o número de vagas só cobre 13% dos candidatos, um sinal de que não é neste portal de emprego a que as empresas recorrem quando procuram por colaboradores com baixo nível de escolaridade.
Fonte: Expansão