A transição política e de modelos económicos entre o colonialismo, o planeamento centralizado (de certa forma hostil à propriedade privada) e a adopção da economia de mercado, depois de 1992, ainda faz mossa quase 45 anos depois da independência. Encerramento deve ser concluído em dois anos.
As cinco entidades extintas com a publicação dos decretos presidenciais n.º 74, 75, 76, 77 e 78, todos com a data de 2 de Abril, praticamente não registavam actividade económica há largos anos, apesar dos custos relacionados com os trabalhadores e manutenção das infra-estruturas. O processo de extinção da Hidroportos, Empresa Nacional de Instalações Especiais (INSTAL), Empresa Nacional de Pontes (ENP), Gráfica Popular e Empresa Nacional do Disco e Publicações (ENDIPU) deve estar concluído nos próximos 24 meses, segundo o mesmo documento.
Nos referidos decretos oficiais, divulgados em Diário da República, João Lourenço assume que as empresas deixaram de cumprir o seu objecto social, “não existindo, deste modo, razões estratégicas para a sua manutenção no Sector Empresarial Público (SEP)”.
Não foram tornadas públicas outras informações importantes, nomeadamente, sobre o número de trabalhadores afectados, embora esta informação tenha sido divulgada pelo Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE), e sobre o património em posse destas entidades.
No que diz respeito à prestação de contas, em 2022, o IGAPE apenas publicou os resultados da Hidroportos (15 trabalhadores), que registou um prejuízo de 34.241.058 Kz, enquanto a INSTAL (17 trabalhadores) obteve um lucro de 3.817.918. Os dados financeiros e operacionais da ENP, ENDIPU e Gráfica Popular, embora estivessem incluídas no SEP, não têm sido divulgados pelo IGAPE.
As empresas Hidroportos (supostamente especializada na construção de obras de protecção costeira e marítima), INSTAL e ENP, que foram criadas no mesmo dia e no mesmo decreto n.º 60/78 de 6 de Abril (assinado pelo então primeiro-ministro Lopo do Nascimento), actuavam no sector da construção, engenharia e obras públicas, enquanto a Gráfica Popular (artes gráficas) e a ENDIPU – Empresa Nacional do Disco e Publicações estavam ligadas a outras actividades económicas. A Hidroportos tem ainda a curiosidade de ter sido dirigida, entre 1983 e 2006, por Carlos Teixeira “Cagi”, mais conhecido publicamente pela sua ligação ao desporto, onde chegou a ser presidente da Federação Angolana de Basquetebol (FAB) entre 1987 e 1996. Quando abandonou o cargo de director-geral da Hidroportos, em 2006, Cagi emigrou para a Austrália.
Ainda os estilhaços do império
Todas estas entidades nasceram após 1975 e antes de 1992, quando vigorava no País um modelo político-económico de gestão e orientação centralizada, que impunha sérias limitações à propriedade e ao investimento privado, que praticamente não existia, estando a actividade empresarial concentrada no formato EP – Empresa Pública ou designações similares (como UEE – Unidade Económica Estatal, por exemplo).
No caso da Gráfica Popular e da ENDIPU, as duas empresas surgiram depois da nacionalização ou confisco aos seus antigos proprietários após a independência, um processo que afectou centenas de empresas fundadas em Angola no período colonial. Estas decisões tinham como objectivo político retirar força e poder ao sector privado, com forte influência portuguesa, permitindo desta forma a transferência de activos e postos de trabalho para a gestão nacional, numa lógica de soberania pós-colonial.
A Gráfica Popular, actualmente sob tutela do Ministério das Telecomunicações, Tecnologias de Informação e Comunicação Social (MINTICCS), foi criada pelo decreto n.º 23/78 de 27 de Fevereiro, depois de confiscada da antiga proprietária, a empresa Portugal, Lda., que detinha uma gráfica e o jornal “Diário de Luanda”, um antigo periódico vespertino alinhado politicamente com o regime colonial.
No caso da ENDIPU, a empresa foi constituída em Julho de 1992 pelo confisco das acções, bens e direitos pertencentes à Companhia de Discos de Angola (CDA), segundo o decreto n.º 34-C/92. A CDA, que tinha sido criada originalmente em 1974 para editar e divulgar a música angolana, tinha como principal accionista o conhecido jornalista, produtor e radialista Sebastião Coelho, figura seminal da imprensa angolana, especialmente da rádio.
Fonte: Expansão