O ativista angolano Rafael Marques reagiu às recentes declarações de Isabel dos Santos, que diz ser alvo de “perseguição política”, denunciando uma série de violações de direitos humanos em Angola, nomeadamente as que assistiu quando esteve preso.
Num post publicado no seu blog Maka Angola, em reação à entrevista da filha do ex-Presidente José Eduardo dos Santos à Deutsche Welle, horas antes de uma outra entrevista que irá ser emitida na CNN Portugal, Marques destaca uma das afirmações de Isabel dos Santos que diz que não tinha “noção da gravidade” da falta de direitos em Angola até ser alvo de um processo judicial no país. “Hoje em dia sei que em Angola se violam os direitos humanos. Confesso que, antes disto, eu também não sabia”, disse a empresária.
Rafael Marques aponta duas situações em concreto que envolvem a filha do antigo chefe de Estado e que diz configurarem violações de direitos: a falta de “liberdade de imprensa” na ZAP TV, de que era dona; bem como “os desgraçados da Areia Branca, na Chicala, que foram violentamente desalojados e retidos ao longo de vários dias pela Unidade de Guarda Presidencial, para que cedessem terrenos para os projetos imobiliários de Isabel dos Santos”.
A propósito de “perseguição judicial”, Rafael Marques faz questão de falar dos seus próprios processos judiciais. O mais conhecido foi a acusação de calúnia e difamação por sete generais e duas empresas diamantíferas, na sequência da publicação do livro Diamantes de Sangue: Tortura e Corrupção em Angola (ed. Tinta-da-China), onde denuncia uma série de violações de direitos humanos sobre os trabalhadores das Lundas.
Sobre a sua primeira prisão, em 1999 — por ter chamado “ditador e corrupto” a José Eduardo dos Santos — o ativista recorda que não teve direito “a comida ou água” e que fez greve de fome. “Tive de aprender, na solitária sem janela nem luz, a dormir coberto de baratas, que pareciam sair interminavelmente do buraco que servia de pia. Não me podia mexer muito, para não as esmagar e ficar empestado com o cheiro dos seus cadáveres”, descreve.
Transferido depois para a famosa Cadeia de Viana, Rafael Marques diz ter-se deparado com condições desumanas. “Testemunhei, por exemplo, o horror da chamada “cela dos judeus”, onde praticamente todos os dias morria um recluso esquelético”, conta. “O corpo ficava exposto o dia todo, num canto onde outros reclusos jogavam cartas ao intervalo.”
Rafael Marques considera que embora Isabel dos Santos “tenha direito” a reagir publicamente ao mandato internacional de que é alvo, tem também direito a ser escrutinada nas suas declarações. E não poupa nas palavras: “Perseguição política é o que a maioria dos angolanos sofre diariamente por causa da herança deixada pelo seu pai, que inclui a escolha pessoal de João Lourenço como seu sucessor”, afirma. “Não há perseguições políticas quando se passeia livremente pelas praias mais badaladas do mundo e se mostram iates e benefícios inatingíveis para a esmagadora maioria dos angolanos.”
Fonte: Club-K