As relações diplomáticas entre Angola e os Estados Unidos da América voltam a registar, hoje, mais um salto, com o encontro, na Sala Oval da Casa Branca, entre os Presidentes João Lourenço e Joe Biden.
O Chefe de Estado encontra-se, desde ontem, em Washington, para a reunião com o homólogo Joe Biden. O Presidente da República chegou à capital norte-americana às 16h00 locais.
É a primeira vez que os dois estadistas se encontram oficialmente, neste formato, para discutir assuntos ligados ao fortalecimento da cooperação bilateral.
De acordo com um comunicado divulgado pela Presidência da República, João Lourenço e Joe Biden vão analisar, durante o encontro histórico, assuntos ligados à cooperação bilateral nos domínios do comércio, investimento, clima e energia e, de modo particular, o desenvolvimento do Corredor do Lobito, que liga Angola à República Democrática do Congo e à Zâmbia para os mercados globais.
“O encontro entre os Presidentes João Lourenço e Joe Biden confirma o interesse dos dois países de trabalhar em parceria estratégica para lidar com os desafios regionais e globais”, lê-se no comunicado da Presidência da República.
Por seu lado, a porta-voz da Casa Branca, Karine Jean-Pierre, acrescentou que a reunião, que visa coroar os 30 anos de relações entre os dois países, vai basear-se nos princípios da Cimeira de Líderes EUA-África, que juntou, à mesma mesa, em Dezembro do ano passado, em Washington, Joe Bidem e líderes africanos, entre os quais o Presidente João Lourenço.
A Cimeira EUA-África, convocada pelo Presidente norte-americano, teve como objectivo demonstrar o compromisso duradouro dos Estados Unidos com o continente africano e a necessidade do reforço da cooperação em prioridades globais compartilhadas.
Os primeiros indícios de que João Lourenço e Joe Biden se encontrariam, a qualquer momento, foram revelados este mês, pelo próprio Presidente norte-americano, na Casa Branca, quando indagado, a propósito, pela correspondente da Televisão Pública de Angola (TPA), por ocasião das comemorações do 48º aniversário da Independência Nacional, assinalado este ano. Sem avançar data, Joe Biden assegurou apenas que manteria este encontro com o homólogo angolano. “Não sei quando, mas tenho a certeza de que o encontrarei”, afirmou o estadista norte-americano, na altura. Convidado, nesta mesma ocasião, a pronunciar-se sobre o 48º aniversário da Independência Nacional, Joe Biden destacou que os angolanos devem estar muito orgulhosos por estarem a construir uma Angola que, sublinhou, vai “tornar-se um dos líderes em África na economia”.
Esta será a segunda vez que os dois líderes mantêm encontro na Casa Branca. João Lourenço é o primeiro Presidente africano a ser recebido, este ano, na residência oficial do líder norte-americano. A primeira vez que João Lourenço e Joe Biden se encontraram neste lugar, mas num formato diferente deste, aconteceu em Dezembro do ano passado, durante um jantar oferecido por Joe Biden aos líderes africanos participantes na Cimeira EUA-África. Na ocasião, os dois Chefes de Estado, que se fizeram acompanhar das respectivas esposas, nomeadamente, Ana Dias Lourenço e Jill Biden, saudaram-se com um aperto de mãos e fizeram uma foto para a posteridade. A recepção de um líder na Sala Oval da Casa Branca é um momento que desperta sempre atenção da média internacional, dado o valor político e diplomático que o acto encerra.
Ainda é desconhecido se o formato preparado para este momento contemplará breves declarações à imprensa, no princípio e no fim das conversações, mas, regra geral, as recepções de líderes na Sala Oval da Casa Branca reservam estes dois momentos à imprensa. Acredita-se, por isso, que o encontro de hoje entre João Lourenço e Joe Biden não fugirá a regra.
A Sala Oval, o compartimento mais conhecido da Casa Branca, é o Gabinete e o local de trabalho do Presidente dos Estados Unidos. É aqui onde são recebidos os convidados estrangeiros em ocasiões de visita de Estado.
Questões estratégicas motivaram o encontro
O representante permanente de Angola junto das Nações Unidas, embaixador Francisco da Cruz, referiu que questões estratégicas, como paz e segurança, estão na base desta visita do Presidente João Lourenço à Casa Branca.
O diplomata, que fez parte da equipa que trabalhou no estabelecimento das relações diplomáticas entre Angola e os Estados Unidos da América, na altura como conselheiro, disse que o papel do Presidente João Lourenço na resolução de conflitos no continente, a dinâmica que vem empreendendo no quadro do papel de Campeão da União Africana para a Paz e Reconciliação em África, questões económicas regionais decorrentes dos investimentos no Corredor do Lobito, para melhorar o acesso aos minerais estratégicos da República Democrática do Congo (RDC) e da Zâmbia levou o Presidente Biden a manter este encontro.
Do ponto de vista dos ganhos, Francisco da Cruz fez saber que este encontro entre João Lourenço e Joe Biden, na Casa Branca, vai permitir a Angola reforçar o reconhecimento americano nas questões regionais importantes para uma agenda comum.
Impacto para a diplomacia angolana
O cientista político e docente universitário angolano Osvaldo Isata considerou a recepção de João Lourenço na Casa Branca um factor importante para a diplomacia angolana e acredita que o mesmo vai gerar um “grande impacto” no seu eixo sobre economia.
O académico acredita que este encontro vai ajudar Angola a reenquadrar-se, ainda mais, no Sistema Internacional, que disse estar a sofrer alterações “muito importantes”, sobretudo no que ao poder económico diz respeito.
“Este encontro vai suavizar ainda mais as relações entre Angola e EUA, que data de há 30 anos”, frisou.
Osvaldo Isata adiantou que a recepção de João Lourenço na Casa Branca, neste formato oficial, acaba por ser, também, o reconhecimento de que Angola tem estado a fazer um esforço grande para a paz e segurança em África, com realce para a Região Austral, referindo que a nova configuração do Sistema Internacional privilegia a paz e a segurança como elementos importantes. “E isto é um dos pivôs da diplomacia angolana liderada pelo Presidente João Lourenço, que tem sabido fazer o seu trabalho de forma pacífica, calma, convidando os actores beligerantes da situação, em Angola, para a busca de soluções”, destacou.
Osvaldo Isata apelou os diplomatas angolanos a tirarem as devidas vantagens deste encontro, alertando para a necessidade de não se reduzir a diplomacia angolana ao Presidente João Lourenço.
Em relação à selecção do tema energia, para este encontro, o académico entende que tal resulta do facto de o mundo estar a viver a era da transição energética, tema que disse ocupar um campo importante no quadro da geopolítica moderna. “O que nós temos vindo a observar é que todas as grandes potências que têm interesse em se manter no Sistema Geopolítico são aquelas viradas para as transformações que o próprio sistema traz”, aclarou Osvaldo Isata, para quem a transição energética configura um dos temas privilegiados neste século XXI.
O cientista político fez saber que o tema transição energética está, do ponto de vista da sua renovação, ligado a um pensamento mais tecnológico de transformação, virado para ajudar os Estados nos processos de desenvolvimento. “Tanto é assim que a energia continua a ser um recurso importante, tal como é o petróleo”, ressaltou.
Valor de ser recebido na Sala Oval da Casa Branca
Debruçando-se sobre a importância de João Lourenço ser recebido na Casa Branca, o cientista político Osvaldo Isata sublinhou que o acto significa que Angola vai estar dentro do interesse americano, com a oportunidade de beneficiar das benesses que o Estado norte-americano tem para com os seus actores. Além disso, acrescentou, os americanos passam a olhar o país como um parceiro estratégico e de confiança.
Este acto, disse, vai impulsionar as trocas comerciais, que poderão abrir-se do ponto de vista das grandes indústrias. “O nosso prestígio no Sistema Internacional vai aumentar, porque a nossa relação com o gigante americano, do ponto de vista geopolítico, é uma relação de parceira”, defendeu.
País seguro para se investir
Para o analista em Relações Internacionais Osvaldo Mboco, a recepção do Presidente João Lourenço na Casa Branca pode ser visto como o reconhecimento do Governo americano em relação às mudanças estruturantes que ocorrem em Angola, com destaque para a transparência, combate à corrupção e melhoria do ambiente de negócio, assim como a adopção de práticas de gestão, quer a nível político, quer económico que estão enquadrados com os valores universalmente consagrados. “É uma demonstração clara de que Angola é um país seguro”, frisou.
O analista em Relações Internacionais indicou que este “encontro histórico” é uma espécie de certificação que poderá, até certo ponto, influenciar os investidores das grandes potências a olharem para Angola como um país bom para se investir e que está aberto ao investimento. “Este encontro abre uma nova página na história das relações diplomáticas entre os dois países e que a política externa angolana está a conhecer novos espaços numa direcção com uma aproximação com o Ocidente”, ressaltou.
Reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas
O também analista em Relações Internacionais Nkikinamo Tussamba vaticina que João Lourenço e Joe Biden vão aproveitar a ocasião para abordar a questão relacionada com a reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas, por ser uma medida que se impõe, tendo em conta o contexto actual.
O Presidente João Lourenço vem defendendo a reforma do Conselho de Segurança há já algum tempo, nos grandes eventos internacionais em que participa. Nkikinamo Tussamba ressaltou que este encontro não é comum e que o Chefe de EStado angolano deve aproveitar abordar com o líder da maior potência do mundo as grandes ideias que tem sobre o país e o continente africano. “Ser recebido na Sala Oval da Casa Branca é um prestígio pessoal e dá importância à política do país do Presidente recebido. A diplomacia ganha bastante, porque é ali o centro da discussão dos grandes assuntos mundiais”, frisou.
Início das relações diplomáticas
Angola e os Estados Unidos da América assinalaram, este ano, 30 anos de relações diplomáticas. As relações diplomáticas iniciaram no dia 19 de Maio de 1993. Em 2010, os dois países assinaram um acordo de parceria estratégica e cooperam em vários domínios, com destaque para o Comércio, Finanças, Energia, Indústria Transformadora, Segurança, Saúde e Justiça. Terceiro maior parceiro comercial dos EUA na África Subsaariana, Angola exporta para aquele país o petróleo, diamantes e compra deste país alimento e equipamentos para o sector Petrolífero.
Fonte: JA