Esta alta de juros faz com que nem o Governo nem os agentes económicos se consigam financiar na banca. Inflação e nova queda do kwanza não dão descanso ao Executivo numa semana em que a Luibor Overnight atingiu o valor mais alto de sempre. Com juros tão altos até os bancos têm medo de emprestar.
Preocupado com as altas taxas de juro que tornam proibitivos os financiamentos ao Estado e à economia, o Presidente da República, João Lourenço, chamou de urgência os líderes das principais instituições bancárias angolanas à Presidência, numa semana em que a Luibor, a taxa de referência aos empréstimos interbancários e que influencia o crédito à economia, bateu níveis históricos.
O principal tema da reunião incidiu sobre a alta dos juros numa altura em que a taxa Luibor Overnight atingiu o valor mais elevado de sempre, acima dos 31% (próximo da inflação). “Os bancos foram chamados para falar sobre as taxas de juro altas, que têm impacto não só no financiamento à economia, mas também ao Estado”, disse uma fonte de um dos bancos, admitindo que o chefe de Estado “está preocupado com o custo do financiamento e a pressão sobre a dívida”.
Em termos práticos, com uma taxa interbancária a rondar os 31%, a inflação claramente acima dos 30%, a que se junta a depreciação constante do kwanza e o elevado percentual de malparado (19,7% em Março), torna-se muito difícil aos bancos concederem crédito à economia. Seja por via do Estado para compra de obrigações de tesouro, cujas taxas de juro andam perto dos 18%, seja por crédito directo aos operadores, que nestas condições implicam taxas finais (fora dos Avisos do BNA) perto dos 35% (Luibor+spread), conforme atesta um administrador de um banco sob anonimato.
Para o primeiro caso, os principais bancos, com mais capacidade financeira, já estão muito expostos com a dívida pública, e para esta remuneração (18%) apesar da segurança que significam, “não são atractivos, são mesmo um mau negócio”, admite. Já para o segundo, “não é possível com estes valores (35%) conceder crédito que seja depois reprodutivo e tenha garantias de reembolso. Para os investidores nacionais restam os Avisos, que apesar de porem a rodar parte da economia que está activa, representam também um custo e um risco para o Estado. Por isso, essa grande aposta no investimento estrangeiro, que é muito mais barato, mas que vai “atrofiando” o empresariado nacional”, remata a fonte.
Por isso a questão levantada pelo presidente sobre a forma como podem os juros baixar em Angola. Ao que o Expansão apurou, os bancos comprometeram- -se a apresentar em breve um conjunto de medidas ao Banco Nacional de Angola (BNA) que podem contribuir para a queda dos juros. Entre as medidas que os bancos pretendem ver concretizadas está o fim do imposto sobre empréstimos interbancários acima de cinco dias – já que consideram que pode desafogar a Luibor de curto prazo – mas também uma melhor e mais efectiva gestão do mecanismo de facilidade de liquidez do banco central, no qual este pode emprestar dinheiro aos bancos em “apuros” de liquidez. “A facilidade de liquidez deve ser mais efectiva, não está sempre disponível e os bancos nunca sabem quando vai funcionar ou não”, admite uma fonte bancária, que defende que estas duas medidas permitiriam só por si agilizar em parte a pressão sobre as taxas de juro.
Inflação e desvalorização
Os banqueiros apontam para a inflação, que no final de Julho era de 31,1%, para justificar uma certa avidez ao financiamento à economia nesta altura. “As taxas altas de juro assustam os bancos, por receios relacionados com o malparado. É quase impossível que uma empresa consiga cumprir o pagamento de um crédito com uma taxa de juro elevada acima do valor da inflação”, alerta uma outra fonte bancária. Por outro lado, também recorrem à inflação para justificar por que é que estão a desinvestir em títulos de dívida, uma vez que as taxas de juro a que o Estado se quer financiar estão muito abaixo desta, configurando aquilo em que no economês se designa de taxas de juro reais negativas (quando a inflação é mais alta do que as taxas de juro).
E há ainda o papel do próprio BNA no meio disto tudo, na sua função de supervisor e de regulador do sector, que tem apostado numa política monetária mais restritiva para travar uma inflação que é altamente pressionada pela constante desvalorização da moeda nacional e da falta de oferta de bens de consumo para suprir a procura, que tarda em dar frutos. Ou seja, a inflação não tem diminuído nem está próxima de valores razoáveis para o tipo de economia que o País tem, e o kwanza não pára de depreciar face às principais moedas. Nunca o kwanza valeu tão pouco e só desde o início do ano já depreciou 8,4% face ao dólar (904,5 Kz esta quarta-feira) e 9,6% face ao euro (1.005,1 Kz).
E apesar de o governador do BNA sempre se defender afirmando que a moeda está enquadrada no regime flexível, especialistas e o próprio FMI entende que “o sistema cambial de Angola não é classificado como um sistema de câmbio livre”. Tudo isto leva a incertezas também sobre o papel e a própria independência do BNA. “Todos nós devemos reconhecer que o nível de integridade e confiança dos agentes no sector bancário deve estar em mínimos de sempre. Esta chamada do Presidente pode ter tido razões fundamentais acima de um simples aviso sobre as taxas de juros, ou pelo menos deveria ter tido”, admite um administrador de um banco.
Fonte: Expansão