As evidências do Relatório Global sobre a Disparidade de Género 2022, do Fórum Económico Mundial, mostram que os últimos dados disponíveis sobre o ODS n.º 5(2) o mundo não está no bom caminho e que serão necessários mais 286 anos para colmatar a disparidade global de género.
“Metade do mundo são mulheres, a outra metade, os filhos delas”. Esta poderosa frase da tanzaniana Éfu Nyaki nunca foi tão necessária para dizer: “meninos chega de brincadeiras estúpidas”. Guerras, mortes, aumento da pobreza e de refugiados, eventos climáticos extremos e feminicídio(1) em alta. Tudo motivos para preocupação e acção imediata. No entanto, o que vemos… são decisões sem sentido de urgência nestas temáticas! Ou melhor, mais guerras e um assobiar para ao lado das prioridades da maioria da população mundial. Mulheres!
Chegados a Março começam as flores, os postais, os discursos politicamente correctos e volta-se o foco momentâneo para a importância económica dos avanços significativos sobre a igualdade do género e os feitos da mulher. No entanto, as evidencias do Relatório Global sobre a Disparidade de Género 2022, do Fórum Económico Mundial, mostram que os últimos dados disponíveis sobre o ODS n.º 5(2) o mundo não está no bom caminho e que serão necessários mais 286 anos para colmatar a disparidade global de género. Há um retrocesso evidente por conta das guerras, da pobreza e da violência em várias dimensões. Portanto, voltando ao início, a minoria que toma decisões pela maioria, dorme e acorda distraída ou então anda há espera da última solução de inteligência artificial! E pergunto-me se haverá inteligência humana na terra? É que no final do dia, são os filhos, os irmãos, os pais e os maridos que não ajudam a mudar esta triste realidade.
Em Angola 50,5% da população são mulheres com uma das maiores taxas de natalidade do mundo, com uma média de 5 filhos, e deste número 55,8% são empreendedoras com rendimentos baixos, devido à degradação do poder de compra, tendo a alta inflação como uma das razões. O que explica que 59% das transferências monetárias do programa Kwenda(3) estejam direcionadas para mulheres. E explica parcialmente que nas esferas políticas, económicas e sociais, a presença feminina é inexpressiva quando comparada com a dos homens. Essa falta de representatividade tem implicações nas decisões que, baseadas numa única perspectiva, que é a masculina, geram desequilíbrios com evidências nas políticas e nos resultados dos rumos socioeconómicos adoptados.
O acesso e as oportunidades explicam a outra parte dos desequilíbrios. O desempenho educativo é igual em termos de género em Angola, de acordo com os resultados do inquérito do Afrobarometro(4), no entanto as mulheres têm menos probabilidades do que os homens de ter uma conta bancária (47% vs. 55%), um rádio (47%vs. 58%), um veículo motorizado (16% vs. 31%) ou um computador (15% vs. 21%). Sinais que as deixam em desvantagem, vulneráveis e em risco de alta e micro violência. Violência confirmada pela conclusão de um estudo de 2023, em que a maioria dos angolanos (62%) diz que a violência contra mulheres é “comum” ou “muito comum” no país. “Cada dia ouvimos histórias mais horríveis de violência contra as mulheres, e cada vez menos sentimos uma ação eficaz do Estado”(5).
Tal como muitos outros países africanos, Angola ratificou importantes instrumentos internacionais sobre direitos das mulheres e igualdade de género e está empenhada na Organização Sustentável das Nações Unidas e no Objectivo de Desenvolvimento n.º 5, “alcançar a igualdade de género e capacitar todas as mulheres e raparigas” (ACNUDH, 2019). No entanto, o Índice Global de Desigualdade de Género do Fórum Económico Mundial (2022) classifica Angola em 125.º lugar entre 146 países na paridade de género. Uma vez mais estamos em compliance normativo, mas na prática confirma os anos que faltam para a igualdade… e a vida é na prática de sobrevivência e violência baseada no género que mata todos os dias. A pobreza, o desemprego e a falta de recursos financeiros são ingredientes que podem levar ao aumento de tensão, de conflito e de violência doméstica com consequências nas crianças, perpetuando disparidades de poder e das normas sociais.
Fonte: Expansão