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Desalojados da Ilha, Chicala e Km 44 esquecidos em casebres nos confins de Luanda – «Estamos a viver tipo cães», o desabafo de quem aguarda há anos pela promessa do Estado

Não têm água corrente, nem hospitais funcionais, nem escolas. Sobrevivem a caçar ratos pelas matas ou a capinar lavras por 500 Kz. São os desalojados da Ilha, Chicala e Km 44, que haviam sido colocados em tendas por apenas alguns dias, mas lá estão há vários anos em casas de chapa, a “conviver” com cobras. Nos desabafos à imprensa, alertam para supostas «burlas» e exigem ao Estado «mais rigor» na distribuição de moradias.

Era Ana Cristina ainda uma pré-adolescente quando integrou o grupo de milhares de pessoas provisoriamente colocadas em tendas com a promessa de receberem casas nos meses seguintes. No bairro em que nasceu, Ilha de Luanda, num dia como hoje, sábado, haveria vizinhos a mandar recados: “Filho, diz na tia fulana que hoje saiu muito peixe!”. Outros aliviariam o corre-corre da semana laboral numa sentada de amigos, com música alta, num ambiente em que o frescor do mar estaria a rivalizar com o inconfundível perfume de uma lambula grelhada.

Mas estas memórias podem estar desactualizadas, porque Ana deixou a Ilha há quase 15 anos. O bairro de que Ana pode agora falar com propriedade é um amontoado de casas de chapa, afixadas no Zango 1, a poucas centenas de metros de um dos mais cobiçados projectos habitacionais do Estado: a Centralidade do Zango 0. Nesta urbanização, os apartamentos são arrefecidos por gigantescos aparelhos de ar condicionado.

Ana admite ter “muita inveja” disso. Mas tem de seguir com a vida. Até porque já não é nenhuma menina. É uma viúva de 23 anos. Mãe de dois filhos. E desempregada, como é a maioria das milhares de famílias transferidas da Ilha de Luanda para o Zango, em Abril de 2009.

Na zona, não há água corrente. A energia eléctrica, que aqui chega de forma clandestina, é uma faca de dois gumes: faz funcionar televisores e geleiras, mas, devido à proliferação de chapas e outros metais com que se ergueram a casas, também está na origem de electrocuções que levam à morte.

Foi por volta das 11h00 do passado sábado, 19, que o NJ “aterrou” no bairro.

Em frenesim, as crianças, todas elas descalças e de tronco nu, quiseram logo saber ao que vinham aqueles homens com máquinas fotográficas e blocos de anotações. Os adultos, por sua vez, mais envergonhados do que desconfiados, apressaram-se a avisar que nada queriam com fotos.

“Vocês vêm sempre aqui nos fazer perguntas, mas casas que é bom nunca vemos”, diz um jovem, com o dedo recriminador apontado aos jornalistas, num gesto que não precisou de qualquer reforço para que os vizinhos, a espreitar por entre as portas de chapa, decidissem todos não dar entrevistas.

É preciso, pois, caminhar um pouquinho mais, para tentar surpreender algum morador que não tivesse ouvido a “ordem” de não falar para jornalistas.

O trajecto faz-se a pé, por entre becos com cheiro a cerveja diversa de fabrico artesanal, da capuca ao quimbombo. Pequenos negócios à porta de casa, como o whisky em pacotinhos ou pedaços de carne de porco frita, completam a decoração do bairro

Fonte: NJ

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