Comerciantes e moradores na zona do mercado de São Paulo contestam a venda desordenada nas ruas e em frente às lojas. O barulho ensurdecedor, o lixo e a insegurança transformam num inferno a vida de quem ali vive e trabalha. Apesar das queixas, lojistas até lucram com presença das vendedoras, porque são os principais fornecedores do negócio informal.
As vendedoras informais que comercializam os seus produtos nas ruas e passeios das imediações do mercado do São Paulo, em Luanda, causam perturbação aos moradores e comerciantes, a maior parte grossistas, daquela circunscrição. Passeios e ruas ficam com os acessos bloqueados, impedindo a circulação de peões e automóveis, por causa dos produtos expostos em plena rua e à entrada das lojas e dos prédios.
A invasão das vendedoras ambulantes já forçou alguns moradores a mudarem de bairro. É o caso de Antoniel Varela, de 54 anos, que preferiu arrendar a sua residência na capital e mudar-se para o Zango-5, para evitar o bulício e a confusão que se gera na zona do São Paulo. “Tive de me retirar daqui, porque não há paz. As vendedoras ocupam toda a rua, fazem muita confusão, e há também muitos roubos, principalmente durante a noite”, relatou Antoniel, que viveu na zona durante mais de 18 anos.
Outros moradores disseram ao Expansão que todos os dias enfrentam dificuldades, devido ao lixo que as vendedoras deixam para trás, ao mau cheiro nas esquinas e ao desrespeito que se faz sentir à entrada dos prédios. “Tudo isto cria-nos muitos transtornos na hora de sair e entrar em casa. O barulho é enorme, não se consegue descansar de dia e temos de deixar os carros na ponta da rua, longe da porta, porque todo o espaço está ocupado”, contou Joana Zemboa.
Conforme constatou o Expansão, a fiscalização actua todos os dias e quase a toda hora, mas não serve de dissuasor. Na zona foram instalados postos móveis da polícia e um dos serviços fiscais da Administração Municipal do Sambizanga para inibir a venda ambulante. Mas, na prática, poucos resultados têm.
Fiscalização aumenta, mas…
A fiscalização aumentou nos últimos dias, depois de o governador de Luanda, Manuel Homem, ter anunciado que “vai trabalhar para acabar com a venda ambulante no casco urbano”. Mas a verdade é que a venda informal não acaba, pelo contrário, aumenta. Um funcionário da administração do mercado disse que esta anarquia resulta da corrupção. Relata casos de “venda ilegal” de senhas para ocupação de espaço na rua. “Se há fiscais todos os dias a fazer ronda pelas ruas à volta do mercado porque é que isso não acaba? É porque há chefes que protegem as senhoras e, em contrapartida, ganham com isso!”, disse a fonte do Expansão, afirmando que o trabalho de combate à venda informal nas imediações do São Paulo “deve ser mais profundo”, porque envolve “peixe graúdo”.
O Expansão constatou que os produtos comercializados na rua são os mesmos que as lojas oferecem. As vendedoras compram na loja para vender à porta do estabelecimento, nalguns casos a preços mais baixos. Se comprarem grandes quantidade têm direito a um bom desconto e, com isso, conseguem vender a um preço inferior ao tabelado.
A “rua do arriou-arriou”, conhecida também como entrada da polícia, é a mais movimentada. Ali é quase impossível transitar de carro devido ao aglomerado de pessoas, no meio da rua. Não há distinção de negócio. Vende-se quase tudo, à unidade e a grosso. Em todos os cantos, encontramos produtos, desde roupa original, calçado, bijuterias, cabelos e perucas, mobília, brinquedos e até alimentos, mal acondicionados e em condições que põem em causa a saúde dos compradores.
Parceiros de negócio
Se, por um lado, a venda informal cria constrangimentos, por outro, é ela que movimenta a economia no mercado de São Paulo e nas próprias lojas. Apesar do incómodo que provocam no trânsito e na circulação de pessoas, os comerciantes não consideram as vendedoras suas concorrentes, mas sim clientes “com quem fecham parcerias de negócio” de grande volume.
“É desconfortável, principalmente na hora de estacionar para descarregar o camião. Mas, apesar disso, elas não podem sair daqui porque são nossas clientes e é com este trabalho que elas também garantem o sustento”, admitiu Kin[1]vunda Sebastião, proprietário de uma loja de cosméticos e de louça.
Na prática, o que é “anormal acaba por ser visto como normal”. Os lojistas reconhecem a condição socioeconómica do País e, por isso, chegam à conclusão de que é normal que as senhoras vendam desordenadamente, porque é a única forma de ganharem a vida. “Não basta tirá-las daqui, é preciso que o Estado organize outros espaços para poderem exercer a sua actividade”, rematou outro lojista.
O mercado do São Paulo sofreu obras de requalificação este ano, durante três meses, e foi reinaugurado em Julho, com 709 bancadas. As vendedoras dizem que “não sentem o aumento do número de bancadas no mercado”, pelo contrário, dizem que reduziu. “As pessoas que receberam bancadas depois da requalificação são as mesmas que lá estavam e o espaço onde meteram o parque de estacionamento veio reduzir ainda mais o mercado, porque muitas ficaram de fora”, atira uma vendedora.
Por causa da venda informal, as bombas de combustível da Total no São Paulo, tiveram de colocar cordas e correntes na entrada e na saída para impedir que as zungueiras e compradores invadam o espaço. Contrataram ainda uma empresa de segurança para controlar o espaço e evitar movimento no recinto
Fonte: Expansão