Os números do INE apontam à criação de 328.808 postos de trabalho formais, enquanto os do Ministério do Trabalho, com base em registo da Segurança Social, apontam a 113.230. Especialistas alertam que, mesmo sendo metodologias diferentes, esta contradição entre os números é prejudicial às políticas para travar o desemprego.
Dados do Instituto Nacional de Estatística (INE) sobre o emprego até ao II trimestre deste ano apontam à criação de 328.808 postos de trabalho formais no País no I semestre, número quase três vezes superior aos dados apresentados pelo Ministério da Administração Pública, Trabalho e Segurança Social (MAPTSS) num memorando sobre Evolução Emprego Formal em Angola no I semestre de 2024, divulgado esta semana, que aponta à criação de 113.230 postos de trabalho neste período.
De acordo com o relatório Indicadores de Emprego e Desemprego do INE, relativo ao II trimestre, no final de Junho, dos 17.873.167 de cidadãos em idade para trabalhar 5.764.313 estavam no desemprego, o que equivale a 32,3% da população activa, enquanto 12.108.854 tinham emprego. Dentro dos empregados, 9.498.590 estavam na informalidade enquanto 2.610.264 tinham emprego formal. Se compararmos estes dados com os de 2023, o número de trabalhadores formais passou de 2.281.456 cidadãos desde o final de Dezembro para 2.610.264 no final do I semestre deste ano. São 328.808 cidadãos empregados formais a mais do que no final do ano passado, segundo o INE.
Estes dados contrastam com os 113.230 avançados pelo MAPTSS, que na sua análise no memorando refere que para a contabilização dos empregados gerados no I semestre foram utilizados como fonte “a base de dados da Protecção Social Obrigatória. Pelo que o número de empregos gerados e extintos no período de referência será medido pelo número de vínculos e desvinculos registados neste período”. Segundo o memorando, neste período foram “destruídos” 3.032 empregos. Neste memorando, o MAPTSS avança que, além dos dados do INE, para a análise aos números do emprego solicita também dados aos vários ministérios (Saúde, Turismo e Cultura foram os únicos que não partilharam esses dados ao MAPTSS) e recorre a informação dos centros de emprego do INEFOP.
Há uma diferença substancial entre as várias entidades consultadas, em que por exemplo os ministérios indicam terem sido criados um total de 153.187 postos de trabalho no I semestre nos sectores privados por si tutelados, período em que a “função pública no I semestre (…) não teve registos de novos postos de trabalho ocupados, segundo a Entidade Recrutadora Única”. Os dados dos ministérios são muito diferentes dos do INE e, apesar de estarem mais próximos dos da Segurança Social, também não “batem”.
É por isso que o MAPTSS (por via do Grupo Técnico Multissectorial para o tratamento de dados numéricos sobre o mercado do Emprego, criado em 2018) acabou por optar pela base de dados da Protecção Social Obrigatória, considerando estes os números oficiais do emprego.
De acordo com a metodologia que consta no memorando, a contabilização do número de postos de trabalho criados assenta em três mecanismos: 1) “pagamento da Segurança Social pela primeira vez; 2) novo pagamento feito para uma pessoa que já estava registada no sistema, incluindo os pagamentos para o mesmo segurado (mesmo número) feito por diferentes contribuintes; 3) qualquer novo desconto (fruto de uma nova relação laboral) para a Segurança Social feito para um segurado antigo será considerado como um novo emprego gerado, mesmo que não se tenha extinguido o vínculo anterior, uma vez que em tese aquele posto de trabalho poderia ter sido ocupado por um desempregado”.
Ainda assim, reconhece como principal limitação a esta metodologia a “ausência de tempestividade na comunicação pelas entidades empregadoras sobre alterações na relação laboral e o respectivo registo pelo Instituto Nacional de Segurança Social- -INSS”, ou seja, o tempo que as empresas demoram para comunicar as alterações das contratações ou até dos despedimentos.
Ainda que se tenha em consideração de que se tratam de metodologias diferentes – os dados do INE resultam de um inquérito a 10.944 agregados familiares – o facto de os números do emprego das diversas entidades não “baterem” uns com os outros faz com que “dificilmente as políticas públicas desenhadas para resolverem este problema tenham resultados positivos”, alerta o economista e investigador económico Fernandes Wanda.
“Este problema não é novo. No estudo que fizemos, o Centro de Investigação Social e Económica da Faculdade de Economia da UAN numa parceira com a SOAS, Universidade de Londres e outros parceiros, entre 2015-2019 detectamos estas disparidades e deixámos, entre outras recomendações, a seguinte: Melhorar o sistema de recolha de dados estatísticos oficiais sobre o emprego, de maneira sistemática para acompanhar as mudanças no mercado de trabalho e condições de emprego. Um maior conhecimento das estruturas de emprego existentes permitirá desenvolver uma política de criação de emprego mais realista e efectiva e medir também os seus efeitos. Dados fiáveis sobre os sectores que criam mais emprego bem como sobre os padrões sectoriais de emprego são necessários para melhor desenhar intervenções que promovam a criação de emprego em sectores estratégicos para a diversificação económica do País.”, sublinha Fernandes Wanda.
Fonte: Expansão