Novo acordo de compensação aponta dívidas confirmadas de 11,4 biliões Kz do Estado à Sonangol, e esta por sua vez deve 7,6 biliões ao Estado. Crédito líquido é a favor da petrolífera nacional que registou quedas de 26% nos lucros para 1,4 mil milhões USD. Especialistas alertam que a relação entre o accionista Estado e a “galinha dos ovos de ouro” atrapalha o processo de privatização.
O Estado voltou a fazer um novo acordo com a Sonangol que adia o pagamento da dívida à petrolífera estatal, que desta vez resultou num crédito líquido avaliado em 3,8 biliões Kz (cerca de 4,5 mil milhões USD). Trata-se de um acordo de compensação de créditos, já que a Sonangol também devia impostos ao Estado, que não prevê o pagamento de qualquer juro nem estabelece qualquer plano de reembolso, alerta o auditor independente às contas de 2023 da petrolífera estatal.
É longo o histórico de “kilapis” entre o Estado e a Sonangol, que tem sido recorrentemente penalizada pela subsidiação estatal aos combustíveis como a gasolina e o gasóleo. Como a factura tem sido sempre bastante elevada, o Estado tem empurrado para a frente o pagamento. Já a petrolífera fica com a tesouraria bastante fragilizada e acaba por também não pagar os impostos ao Estado.
Aprovado em Maio de 2024, o “Acordo de compensação de créditos não tributários do Estado a favor da Sonangol EP por dívidas tributárias e não tributárias da Sonangol a favor do Estado” (Acordo-2023), aprova e formaliza a regularização dos créditos e dívidas existentes entre o Estado e Sonangol mediante a compensação de saldos com referência a 31 de Dezembro de 2023 e que a esta data já se encontravam em processo de negociação. O objectivo é “limpar” saldos que vêm de há muitos anos e para isso fez-se este tipo de acordo pela terceira vez. Como não avançam com qualquer plano, admite-se que a fórmula do pagamento com compensação de saldos vá sendo repetida até que o Executivo termine de vez com a subsidiação aos combustíveis.
Assim, no âmbito deste acordo, foi confirmado que o Estado devia 11,5 biliões Kz à Sonangol, que é o saldo remanescente do acordo de compensação anterior, bem como de dívida relativa à subvenção dos combustíveis e de créditos vencidos associados ao Plano de Reembolso do Programa Nacional de Urbanismo e Habitação (“PNUH). Por sua vez, também foram confirmadas dívidas tributárias da Sonangol avaliadas em 5,2 biliões Kz e créditos não tributários do Estado sobre a Sonangol no valor 2,4 biliões Kz, o que perfaz um total de 7,6 biliões Kz. Assim, o saldo entre o que Estado deve à Sonangol, e vice-versa resultou em um crédito líquido da Sonangol sobre o Estado de 3,8 biliões Kz.
Mas a dívida do Estado à petrolífera é superior à deste acordo. Isto porque à data do balanço, encontrava-se ainda em processo de validação e reconciliação créditos da Sonangol sobre as unidades orçamentadas e entidades públicas, nos quais se incluem pagamentos efectuados a terceiros e por conta do Estado.
Esta informação consta no relatório e contas de 2023 da Sonangol e foi alvo de uma reserva do auditor independente, a KPMG, que alerta que a recuperação dos créditos já vencidos a favor da petrolífera será efectuada, sem juros, por compensação com créditos supervenientes, incluindo os resultantes de operações comerciais, alocação de carregamentos de petróleo bruto e dívidas fiscais, uma vez que não existe a esta data um plano de reembolso destes créditos.
Assim, segundo o auditor, “não é possível determinar a tempestividade do seu recebimento e, consequentemente, o seu valor actual, bem como o impacto na apresentação entre corrente e não corrente”.
Sonangol é usada como fundo Soberano
Para os especialistas consultados pela imprensa, a relação do Estado com a Sonangol condiciona o desenvolvimento da petrolífera, uma que é usada como “bombeiro” para acudir às dificuldades que o País tem enfrentado durante vários anos.
Para Flávio Inocêncio, especialista, estas dívidas condicionam o crescimento e atractividade da Sonangol, uma vez que apesar de ser uma empresa pública persegue o lucro como qualquer outra empresa. “Infelizmente, a Sonangol sempre foi utilizada como uma espécie de fundo soberano do Estado. E tem condicionado a empresa”, disse o especialista, acrescentando que “ninguém vai querer investir em empresas com essas finalidades públicas, com muitas dívidas, com um passivo enorme e sem a capacidade ter um fluxo de caixa contabilisticamente aceite”.
“Penso é que é preciso haver uma clarificação, principalmente do ministro de tutela e também do ministro para a coordenação económica, uma vez que a Sonangol é utilizada como empresa petrolífera e também como empresa para fins de desenvolvimento económico e electrificação do País”, defende.
Fonte: Expansão