Adalberto Costa Júnior cansou-se da estratégia norte-americana em relação a Angola, e, pela primeira vez, teceu imensas críticas públicas à Administração Biden, bem como ao embaixador Tulinabo Muching, para quem está a dirigir as relações entre os países como se se tratasse de uma “cooperação partidária”. Entretanto, alguns observadores apelam ao líder dos maninhos para que esqueça o passado, melhore as relações com Moscovo e amplie a cooperação com Pequim.
Está a fazer destaque em diferentes jornais online, nacionais e estrangeiros, o ataque que o presidente da UNITA, Adalberto Costa Júnior, teceu às autoridades norte-americanas. De forma corajosa e inédita, o líder do maior partido na oposição em Angola, que mantém uma velha tradição de aproximação aos Estados Unidos da América (EUA), acusou a maior potência mundial de ter dupla face quando se trata de Angola, em que, de um lado condenada, e do outro, elogia.
Adalberto Costa Júnior fez esta constatação em Benguela, à margem do lançamento da obra ´Estado Rico, Estado Pobre´, da autoria do sul-africano Greg Mills.
De referir que a presente manifestação de repúdio de Adalberto Costa Júnior em relação a Washington, é corroborada por Abel Chivukuvuku, candidato a vice-Presidente da República pela lista da UNITA/FPU, em 2022, período em que o mesmo acusava a comunidade internacional de valorizar os interesses comerciais em detrimento do bem-estar das pessoas.
Na década de 1980 e 1990, a UNITA chegou a actuar como uma espécie de longo braço dos EUA para a defesa e expansão da democracia em Angola e na região da SADC, tendo para o efeito beneficiado de muita ajuda em dinheiro e equipamento militar, visando derrotar o MPLA, que tinha igualmente o apoio incondicional de Cuba e da Rússia.
Entretanto, os tempos mudaram, e os EUA estabeleceram relações com as autoridades angolanas em 1993. Daí para diante, a Casa Branca não mais forneceu ajuda à UNITA, embora mantivesse canais de diálogo, face aos laços e a ideologia defendida.
Em 2022, na véspera das eleições-gerais de 24 de Agosto, a UNITA, com a cobertura da media, em que se destacaram alguns semanários nacionais, e órgãos de comunicação social estrangeiros, alimentou a falsa ideia de que tinha o apoio dos EUA.
Hábeis jogadores de política internacional, os políticos norte-americanos, de forma individual ou institucionais, emitiam inúmeros pareceres negativos sobre a forma como o processo eleitoral estava a ser conduzido, desde o aparecimento de mortos nas listas de cidadãos maiores registados para o voto, a não publicação dos cadernos eleitorais, a fraca cobertura da media pública aos actos de partidos na oposição, portanto, foram pareceres que estavam de encontro com as queixas da UNITA.
Num dado momento, os líderes da UNITA eram convidados para os EUA, noutro eram chamados de forma secreta para a residência oficial da então embaixadora dos EUA em Angola, Nina Maria Fite. Toda essa movimentação contribuiu para a ilusão… uma ilusão que acabou abrupta quando os EUA, sem demora, reconheceram os resultados eleitorais poucas horas depois de o Tribunal Constitucional ter validado os resultados apresentados pela Comissão Nacional Eleitoral. E manifestou o desejo de trabalhar com o novo Executivo.
Praticamente abandonada, apesar dos contactos que visou a apresentação de sua contagem paralela aos parceiros ocidentais, a UNITA apelou para que o povo mantivesse a serenidade, e que não saísse à rua.
Para lá dos factos enunciados, os EUA e o Governo angolano olearam as relações, tendo estendido a parceria para vários domínios. Os EUA prometem prosperidade mútua, investiram forte nos sectores da energia limpa, telecomunicações, e poderá estar na forja apoios em áreas de defesa e segurança.
A Casa Branca, cujo chefe máximo considerou Angola o país mais importante de África, já manifestou publicamente o apoio de uma possível candidatura de João Lourenço a presidente da União Africana.
Portanto, a UNITA vê claramente que está a perder terreno na relação com a maior potência económica e militar do mundo, por quem, durante muito tempo, esteve do outro lado da barricada ideológica.
A crítica nunca antes feita
Reagindo à imprensa em relação ao novo normal na relação entre o Governo angolano e a Casa Branca, Adalberto Costa Júnior justificou a crítica que direcciona aos EUA com certos comportamentos que ficam aquém daquilo que é o perfil da postura norte-americana no mundo. E sublinhou que manifestou essa insatisfação ao embaixador Tulinabo Mushingi.
“Há menos de três semanas, nós, de forma muito directa, dissemos ao embaixador americano que os Estados Unidos devem mudar a postura em relação à sua abordagem aos problemas de Angola”, fez saber, tendo realçado que, em muitos casos, as autoridades norte-americanas tem fechado os olhos a algumas situações em Angola.
“Há uma postura do resto da comunidade mais corajosa, crítica, pressionante sobre o Governo e tem havido uma postura americana que tem fechado olhos àquilo que tem sido o desastre angolano”, disse, tendo ainda acrescentado que, “os Estados Unidos não cooperam com o Governo de Angola, cooperam com o país (com os cidadãos, com a sociedade…). A actual embaixada dirige o modelo de cooperação partidária”, rematou.
O Fundo Monetário Internacional (FMI) também não foi poupado. O presidente da UNITA acusou a entidade de produzir relatórios que variam entre a crítica e o elogio, apesar daquilo a que tomou por “desastre” da governação.
Sugestões…
Apesar de tudo isso, como dizia no passado Jonas Savimbi, de que não havia um campo em que poderia cooperar com os russos, a UNITA continua travada nessa perspectiva. Para diferentes observadores da política doméstica, já é hora de o ‘galo negro’ normalizar as relações com a Rússia e o Partido Comunista Chinês.
A Guerra Fria, marcada por conflitos ideológicos, acabou há mais de três décadas, o que deixa de fazer sentido a contínua barricada que a UNITA tem erguido face a Moscovo. E os ensinamentos práticos de Jonas Savimbi, que se associara ao Apartheid, sobre não olhar se estão limpas ou sujas as mãos de quem o possa salvar, devia ser seguido sobretudo no contexto actual.
Por exemplo, embora apregoava o respeito pelos direitos humanos e a luta pelo direito dos povos africanos, Jonas Savimbi, face ao contexto de guerra que travava com o MPLA, este apoiado pela Rússia e a Cuba, aliou-se a Pieter Botha e ao seu regime de Apartheid, um regime encabeçado por gente branca, de segregação racial, imposto à Pretória entre 1948 e 1994.
Para Savimbi, estava em jogo a sobrevivência da UNITA, e, por isso, valia o sacrifício.
Recorde-se que numa das orientações passadas a Jardo Muekalia, seu pupilo, que se deslocara a Londres, visando levar o Ocidente a olhar para aliança ‘UNITA-Apartheid’ como aspectos normais no contexto de então, Jonas Savimbi instruiu entre outras o seguinte: ”[convencer] os círculos de influência londrinos que [a parceria UNITA-Apartheid] se tratava de uma coincidência de interesses no quadro geopolítico, e que a história tinha vários exemplos deste tipo de alianças, como (…) entre Hitler e Estaline, no princípio da Segunda Guerra Mundial, [mas que] não levou Estaline a aderir ao Nazismo; a aliança entre Churchill e Estaline não levou o povo inglês e o seu líder a aderir ao comunismo. Era, antes de tudo, uma questão de sobrevivência”, dissera Jonas Savimbi, em nota de instrução, como consta no livro intitulado: “Os serviços secretos na História de Angola”, da autoria de Cesaldino Armando Kassuanga.
Contrariamente ao que lhes foi ensinado por Jonas Savimbi, os quadros da UNITA estão presos nos velhos aliados e na forma de fazer política ao estilo do passado.
Diferente do MPLA, a UNITA, na arena internacional, é altamente previsível. Quando se deu a invasão da Rússia sobre a Ucrânia, o ‘galo negro’ acorreu à Assembleia Nacional, visando um projecto de condenação contra Moscovo. Nada mal, dado que se tratava de violação à integridade territorial. Mas o projecto estava carregado de antagonismo, tendo em conta que não levava em consideração as preocupações de segurança levantadas pela Rússia.
Em suma, a UNITA é aconselhada a olhar o mundo como é hoje, estabelecendo relações e parcerias sem preconceitos e ideias preconcebidas.
Fonte: CK