A situação pode vir a agravar-se, com o fim da subsidiação dos combustíveis, que vai ser feita gradualmente já a partir de 2023. Em muitos casos, os custos com transportes acabam por ter um peso enorme nas despesas mensais. Quem tem viatura aproveita fazer serviço de táxi para reduzir custos.
É segunda-feira e são 5h00, o mundo mal despertou, mas Francisco Chivinda já esta na paragem de táxi para cumprir o horário de entrada no emprego, que é as oito horas. É uma rotina que se repete cinco vezes na semana, um percurso de pouco mais de 40 km de casa (Zango IV – município de Viana, até ao largo 1º de Maio). É um trajecto que está desenhado na palma da mão nos últimos três anos, mas que lhe custa em média 2.000 Kz/dia, 44.000 Kz em um mês de 22 dias laborais. Além de “gastar” horas na luta pelo táxi e mais o tempo do percurso.
Rui Silva também vive no Zango IV, mas diferente do Francisco Chivinda, tem viatura própria e gasta 5.000 Kz em combustíveis para quatro dias de trabalho, contas feitas são 27.500 Kz nos mesmos 22 dias úteis. Chega-se à conclusão que neste caso do Zango IV, os custos mensais com táxi chegam a mais de 60% do que sair de casa para o trabalho com viatura própria, que no caso específico de um Hyundai modelo i20, consome em média 6,4 litros em cada 100 Km, e onde obviamente, não estão adicionados os custos com a manutenção do carro que são imprevisíveis e o valor do investimento na viatura.
Este caso do Zango IV é apenas um, porém a realidade assemelha-se muito com os que vivem nas zonas do Benfica, Vila de Viana, Sequele ou Kilamba, e têm os seus postos de trabalho no centro da cidade.
A situação pode vir a agravar-se tanto para Rui Silva como para Francisco Chivinda, como para tantos outros que partilham as mesmas “provações”, se se concretizar o fim da subsidiação dos combustíveis, que vai ser feita gradualmente já a partir de 2023. Com um preço real dos combustíveis, na casa dos 398 Kz mais do que o dobro em relação aos 160 Kz actuais, como calculou Expansão na edição nº 702, Rui Silva, que é funcionário público, passaria a gastar com o combustível quase três vezes mais do que agora, ou seja, saindo dos 27.500 Kz/mês para mais de 68.000 Kz/mês, o que se tornaria quase “impossível” com os salários praticados actualmente, sendo que do lado do Chivinda os preços dos transportes também podem vir a disparar.
“Às vezes, já é difícil manter o carro na estrada todos os dias, por isso prefiro ser madrugador, acordar mais cedo e aproveitar fazer serviço de táxi a caminho do trabalho, isso ajuda a custear o combustível”, explica Rui Silva
Falta transportes públicos
O fim da subsidiação dos combustíveis pode forçar um investimento no sector dos transportes públicos, servindo como solução para amortizar o choque nas tarifas dos transportes e aumentar outras alternativas de locomoção. “Os autocarros públicos são poucos. Quando estou no limite financeiro uso autocarros, mas só para voltar para casa. Para ir para o serviço é mais complicado tem que ser muito mais cedo”, explica Chivinda, que vira olhos instantaneamente para lado de onde vem os táxis, levantando os braços. Algumas vezes de forma inútil, pois alguns carros já estão lotados e tem que esperar.
Em grandes cidades, em termos demográficos, é normal haver movimentos apertados no trânsito, por isso Luanda não é excepção. A diferença do mais ou menos aperto também reside na cobertura dos transportes públicos, que acaba por ter repercussão directa no trânsito, desafogando-o, de acordo com especialistas em mobilidade. “Os custos com transportes acabam por ter, no fim das contas, um peso enorme nas despesas mensais. É difícil para mim, é difícil para todos que diariamente viajam grandes distâncias para chegar no trabalho a hora”, diz Eduardo Joaquim (nome fictício), professor do ensino primário, que vive no Benfica e trabalha no centro da cidade de Luanda. E acrescenta que não consegue viajar de autocarro, porque sente-se sufocado por causa das “condições difíceis com que as pessoas são transportadas”.
Afecta produtividade
Quando se trata de grandes distâncias os trabalhadores necessitam muitas vezes de pegar vários táxis para realizar o percurso da residência para o trabalho e vice-versa. E durante o percurso, são desafiados com dificuldades de várias ordem, podendo trazer mudanças no comportamento individual, o que origina alterações no desempenho das actividades profissionais, de acordo com o sociólogo Adriano Tandela. “Há também um desequilíbrio emocional com o stress e a aflição e isso afecta na produtividade do trabalhador”, referiu ao Expansão.
Dona Helena vive na Vila de Viana e gasta em média 1.500 Kz/dia, para ir e voltar. Trabalha como doméstica no distrito urbano da Maianga, e confirma que se sente cansada quando chega ao local de trabalho. De acordo com Adriano Tandela, as condições sociais dos trabalhadores não permitem que a mão-de-obra angolana seja competitiva.
Fonte: Expansão