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Vendedores podem ser responsabilizados por realizar actividade em locais impróprios

Maria Paulino, 27 anos, desarruma às pressas os frascos de perfume e um pequeno monte de brincos e relógios, que comercializa no chão, na conhecida Ponte Amarela, na vila de Viana, pelo aproximar de um agente da Polícia Nacional.

Tal como ela, outras vendedoras, também, se empenham em desfazer rápido o negócio exposto no chão, com medo de perderem os produtos ante a presença do referido agente policial, que ronda o espaço. 

O aproximar do agente da Ordem Pública, as vendedoras levantam tudo e metem-se em fuga. Vão ao outro ponto do local. E dez minutos após a retirada do polícia, as senhoras voltam ao espaço e expõem, outra vez, os produtos no chão. 

Apesar de ter a criança às costas, Maria tem agilidade para correr e garantir segurança do pequeno que carrega. A correria é constante, mas, teimosamente, ela e as colegas não desistem de regressar ao lugar e continuar as vendas. 

Para os agentes da Polícia, esse cenário é um autêntico desafio. A pretensão é repor a ordem, mas esse trabalho, às vezes, acaba em confronto entre os efectivos do Comando Municipal de Viana e os vendedores ambulantes. Chega-se à violência física e verbal.

Maria Paulino conhece os riscos de vender na rua, de forma desordenada. Mas, por ser desempregada, a jovem moradora do bairro Boa-Fé, diz encontrar nessa actividade a única forma de sustento dos cinco filhos e do esposo, que está, igualmente, sem emprego. 

A senhora esclarece que as vendas na Ponte Amarela ou nas ruas da Estalagem são sempre vantajosas, pelo número de pessoas que acorrem aos dois lugares, embora sejam espaços proibidos à venda fixa.

“Nos mercados não há espaço. Por isso, ficamos na rua a despachar o nosso negócio”, disse Catarina Panzo, 45 anos, outra vendedora, que encontramos na zona do Calemba II. A senhora comercializa peixe, num espaço onde contabilizados cerca de 500 vendedores, de forma desordenada! 

A desarrumação que se observa no local, segundo um agente Regulador de Trânsito, impede a normal circulação de pessoas e viaturas, criando, assim, enormes engarrafamentos. 

Consciente dos transtornos que cria, às vezes, com a actividade que exerce, Jacinto Ndongala, vendedor de calçados num dos passeios da Rotunda do Camama, aconselha os companheiros a ajudar o Estado no combate às transgressões administrativas, optando por venderem em locais apropriados. 

Para o jovem, o correcto é a venda ambulante e não a exposição fixa, no chão, dos produtos. Mas, a constatação é, depois das 16h00, o local se transforma num autêntico mercado a céu aberto, onde se vende de tudo um pouco. 

Um perigo à espreita 

Além de representar uma transgressão administrativa, a venda desordenada, principalmente a que se faz à berma da estrada, é um cenário de perigo para os vendedores e compradores, como concorda Jacinto Ndongala. 

Para evitar o pior, a nossa equipa de reportagem constatou que são os automobilistas que optam por marcha lenta, dada à ocupação de vendedores e compradores em partes consideráveis da via de tráfego e da travessia desordenada de peões. 

Mas, a venda desordenada não é só feita apenas na zona suburbana de Luanda. Na Mutamba, por exemplo, algumas senhoras juntam-se em determinados pontos próximos do edifício do Ministério das Finanças e na paragem de autocarros, para expor em panos e papelões estendidos no chão uma série de produtos. 

Outras andam pela cidade com os produtos à cabeça e no  fim do dia concentram-se numa das pedonais do Congolenses, onde se vende, desde bijuterias, bens alimentares e higiênicos a material escolar. 

Entre essas senhoras está Narciso João, 28 anos, comerciante de cintos, fatos e calçados. O jovem deambula pela cidade, mas, no fim do dia, concentra-se nessa pedonal, onde atravessam centenas de pessoas naquele período.

Bancadas à espera de ocupação 

Enquanto as ruas estão cheias de pessoas que vendem produtos no chão, um total de 85 mil lugares existentes em 208 mercados existentes nos nove municípios de Luanda está livre, segundo dados fornecidos pelo director do Gabinete de Desenvolvimento Económico Integrado do Governo Provincial. 

Pedro Palata disse ao Jornal de Angola que o município de Viana, pela dinâmica demográfica, tem o maior número de mercados, um total de 77, seguido por Cacuaco, com 27, numa altura em que Icolo e Bengo e Quiçama, com 12 espaços cada, e Belas, 11, são os que possuem menos mercados. 

A par desses, a província tem ainda 17 mercados nos municípios do Cazenga, 14 no Kilamba Kiaxi e Talatona, respectivamente, e 24 em Luanda. 

A grande preocupação das autoridades é fazer com que os vendedores ocupem as perto de 127 bancadas que andam desocupadas, num total de 85 mil lugares livres nos mercados de Luanda, tendo em conta que cada uma dessas bancas podem ser ocupadas por mais de dez pessoas. 

Pedro Palata explica que o processo de acesso por parte das vendedoras às bancadas existentes nos mercados é célere e simples. Para isso, diz que basta os interessados dirigir-se à administração do mercado desejado, com cópia de Bilhete de Identidade e requerer o espaço. 

O requerente paga, ainda, uma taxa estipulada no Decreto Presidencial 47/18 sobre o Regime de Taxas, Licenças e outras receitas cobradas pelos Órgãos da Administração Local do Estado, em função dos produtos a comercializar, entre 0,375 a 1 UCF, o mesmo 35 a 88 kwanzas por metros quadrados.

Pontos críticos já identificados 

O Director do Gabinete de Desenvolvimento Económico Integrado acentua que foram já identificados os principais pontos críticos onde se fazem a venda desordenada. 

Por isso, salienta que decorrem acções de sensibilização e transferência de vendedores em mercados com capacidade ociosa, para ocuparem os cerca de 85 mil lugares livres em Luanda. 

Explicou que se criou um grupo de trabalho para elaborar uma estratégia mais integrada, que incluirá medidas de vária índole, com vista a reduzir e prevenir a venda desordenada em Luanda. 

O responsável sublinhou ser importante distinguir venda ambulante da desordenada. Explicou que primeira encontra respaldo jurídico na Lei 26/21, de 18 de Outubro, que altera a Lei nº 1/07, de 14 de Maio (Lei das Actividades Comerciais) e na Lei 15/19, de 23 de Maio (Lei Sobre a Organização, Exercício e Funcionamento das Actividades de Comércio Ambulante, Feirante e de Mercado). 

O director esclareceu que esses diplomas consideram a venda ambulante como o exercício da actividade comercial a retalho de forma não sedentária nos locais por onde passa o vendedor ou em zonas que lhe sejam previamente definidas pela entidade competente. 

A avaliação feita, acrescenta, mostra que a venda ambulante está a ser realizada sem a observação do estipulado na lei, o que constitui transgressão administrativa. Por isso, alerta que os que insistem podem ser responsabilizados. 

“Os vendedores não devem impedir ou dificultar o trânsito nos lugares destinados à circulação de peões e veículos, o acesso à exposição dos estabelecimentos comerciais, aos meios de transportes e às paragens de veículos, permanecer e a fixar-se em lugares proibidos ou não autorizados para a venda”. 

Pedro Palata realça que a venda ambulante em si é de lei, mas não permite que as pessoas exponham os negócios no chão e vender. 

Programas para ordenar a actividade 

Pedro  Palata avança que existem vários factores sociais que influenciam a venda ambulante, mas condena todo o tipo de atitudes que colocam em perigo a vida das pessoas. “O objectivo do Governo não é acabar com a venda ambulante, por ser uma actividade de lei. Queremos é acabar com a venda desordenada”. 

Uma das soluções para acabar com a venda desordenada, segundo o director, passa por um trabalho articulado com vários departamentos ministeriais, tendo em conta que foram identificadas causas de carácter estrutural, a começar com o crescimento e estrutura demográfica da província. 

Pedro Palata refere que essas questões são influenciadas, ainda, pela migração interna, urbanização, elevada taxa de desemprego, em particular da juventude, níveis de pobreza, entre outras. 

Para travar essa desordem, destaca a execução dos programas de Reconversão da Economia Informal (PREI), Apoio à Produção, Diversificação da Economia e Substituição das Importações (PRODESI), Programa Integrado de Desenvolvimento do Comércio Rural (PIDCR), Integrado de Intervenção nos Municípios (PIIM), Programa Integrado de Desenvolvimento Local e Combate à Pobreza (PIDLCP) e o Integrado de Intervenção na Província de Luanda, aprovados recentemente, compreendem um conjunto de acções que contribuirão para mitigar a venda desordenada. 

Explica que, a curto prazo, o Governo Provincial de Luanda, através das Administrações Municipais, está a levar a cabo acções que visam assegurar a realização da venda ambulante em conformidade com a legislação. 

O Director do Gabinete Provincial de Desenvolvimento Econômico Integrado admite que o grau de informalidade e a mobilidade dos vendedores ambulantes (entrada e saída neste negócio) dificulta o processo de controlo deste grupo social.  “Mas, mantém-se boas as relações com a Associação de Vendedores Ambulantes de Angola, no sentido de permitir o diálogo e o controlo desta categoria de comerciantes”, remata. 

Fonte: JA

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