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Tribunal determina arresto de bens de Isabel dos Santos

O Tribunal Supremo determinou o arresto preventivo de bens e valores financeiros num montante global de mil milhões de dólares(USD 1.000.000.000,00) da empresária e ex-PCA da Sonangol Isabel dos Santos, a partir de vários expedientes bancários.

Assim, o Tribunal esclarece, ao abrigo do artigo 9º da Lei nº 15/18, de 26 de Dezembro, do artigo 17º e do nº 1, do artigo 31º da Convenção das Nações Unidas contra a Corrupção, que o arresto é consubstanciado em: 100 por cento das suas participações sociais da empresa EMBALVIDRO-Indústria (SU) LDA, em que Isabel dos Santos era a única beneficiária.

A Câmara Criminal do Tribunal Supremo, no despacho assinado pelo juiz Daniel Modesto Geraldes com data de 19 deste mês, indica que são arrestados todos os saldos das contas de depósitos à ordem tituladas ou co-tituladas (ou onde conste como procurador e/ou autorizado), sedeadas em todas as instituições bancárias, incluindo as contas depósitos a prazo, outras aplicações financeiras que estejam associadas àquelas, incluindo dossiers de títulos em nome da arguida Isabel dos Santos.

Nesta ordem, o Tribunal autorizou, igualmente, o arresto de 70 por cento das participações sociais na empresa UPSTAR Comunicação e foram tomadas, ainda, 70 por cento de duas participações na MSTAR, SA. empresa de telecomunicações em Moçambique. Nas duas situações a arguida era a beneficiária efectiva.

Igualmente, 100 por cento das empresas UNITEL T+ em Cabo Verde e UNITEL STP, SARL em São Tomé e Príncipe e as participações sociais de Isabel dos Santos nas empresas UNITEL INTERNATIONAL HOLDING BV e UNITEL INTERNACIONAL BV foram arrestadas, também, a 100 por cento.

IGAPE INDICADO COMO FIEL DEPOSITÁRIO

Nesta ordem, o Tribunal indica fiel depositário das participações sociais das empresas acima referidas, com excepção da empresa EMBALVIDRO- Indústria (SU), Lda, que sejam nomeados os próprios Conselhos de Administração. Requer, assim, para fiel depositário da EMBALVIDRO que seja nomeado o Instituto de Gestão de Activos e Participações do Estado (IGAPE), nos termos da al.i) do artigo 4º do Decreto Presidencial nº 72/20, de 29 de Março.

Em relação às vantagens do facto ilícito, refere que indiciam fortemente que a UNITEL S.A é uma sociedade comercial angolana, constituída a 25/08/1999, com sede em Luanda-Angola, e tem como objecto social a instalação, exploração e prestação de serviços de telecomunicações e outras actividades conexas complementares.

Até recentemente, a UNITEL S.A foi participada por quatro accionistas cada um com 25% do capital social, nomeadamente: MERCURY-MSTELECOM-SERVIÇOS de TELECOMUNICAÇÕES, S.A, uma empresa subsidiária da empresa pública angolana Sonangol, E.P;

A VIDATEL LTD, constituída a 14/12/1999, com sede nas Ilhas Virgens Britânicas, cuja beneficiária efectiva é Isabel dos Santos; entre 14/12/1999 e 16/11/2017, Tatiana Cergueevna Regan, mãe de Isabel José dos Santos, constou como única directora da VIDATEL LTD; a partir de 26/11/2017, Luís A. Davis constou como presidente e director da sociedade em causa e Pamela D. Haal como tesoureira, secretária e directora;

A GENI, S.A, cujo beneficiário efectivo é o general Leopoldino Fragoso do Nascimento; e,  PT VENTURES SGPS, S.A, sociedade de direito português, detida até Janeiro de 2020 pela AFRICATEL HOLDING, B.V, esta última uma subsidiária da operadora de telecomunicações brasileira OI, S.A.

ARRESTO ANTERIOR 

Em Dezembro de 2019, as acções da UNITEL S.A detidas pela VIDATEL LTD foram arrestadas pela justiça angolana, no âmbito do processo nº 3301/2019-C. Em Janeiro de 2020, a Sonangol E.P adquiriu as acções da UNITEL SA que pertenciam à PT VENTURES SGPS, SA.

Actualmente as acções da VIDATEL LTD e da GENI, SA foram apreendidas pelo SENRA, pelos seguintes factos: a Sonangol, EP, em data não determinada, iniciou um projecto de telecomunicações com o objectivo de obtenção da licença GSM para telefonia móvel, tendo celebrado um contrato com a empresa de direito inglês Ericsson, para o fabrico e instalação dos respectivos equipamentos;

Neste âmbito, foi criado um grupo de trabalho constituído essencialmente por funcionários da Sonangol, EP; Todo o investimento para a instalação da infra-estrutura da rede GSM foi efectuado pela Sonangol, cujo montante apurado é superior a USD 48 736 157,00. Entretanto, após a conclusão do projecto, por razões ainda desconhecidas, estranhamente a licença de rede GSM não foi atribuída a Sonangol, que na verdade é a real investidora, tendo sido entregue a UNITEL SA;

Essencialmente, apenas eram accionistas da UNITEL, SA a PT VENTURES SGPS, SA, VIDATEL LIMITD e a GENI, SA. Facto é que os accionistas acima mencionados, excepto a PT VENTURES SGPS, SA, nunca efectuaram qualquer pagamento a favor da Sonangol a título de devolução, tendo apenas recebido facturas referentes à aquisição dos equipamentos e outras despesas que as pagou e reconheceu como encargos, investimentos e obrigações.

Como “prémio de consolação”, a Sonangol, EP, através da empresa Mercury, tornou-se accionista da UNITEL, após celebração de um contrato de permuta, passando a deter 25% do capital social;

Ou seja, o investimento para a criação da UNITEL SA pertenceu exclusivamente à Sonangol e esta tornou-se sócia através da sua participada Mercury, exactamente com o mesmo número de acções que outros accionistas.

Concluindo-se que dado o investimento inicial pertencer à Sonangol, os proventos do negócio (dividendos) também deveriam pertencer ao Estado e não entregues como foram durante anos à GENI e VIDATEL LIMITED. Existindo claramente indícios do crime de peculato, tráfico de influência, previstos e puníveis, nos termos dos artigos 362º, 364º, do C.P e 82º da Lei nº 5/20, de 27 de Janeiro, respectivamente.

CONSELHOS DE ADMINISTRAÇÃO

O Tribunal Supremo esclarece, a propósito, que Isabel José Eduardo dos Santos integrou o Conselho de Administração da UNITEL SA desde 28/02/2001 até 11/08/2013, tendo sido presidente do mesmo Conse-lho entre 2/05/2013 e 19/03/2019. Refere que Manuel Domingos Vicente enquanto representante da MERCURY foi presidente do Conselho de Administração da UNITEL desde 28/02/2001 até 6/03/2012. Entre 1999 e 30/01/2012, Manuel Domingos Vicente foi também presidente do Conselho de Administração da Sonangol, EP.

Acrescenta que Leopoldino Fragoso do Nascimento para além de accionista da GENI- SA, foi presidente da mesa de Assembleia Geral da UNITEL desde 9/08/2013 até 7/05/2020, data em que passou a vice-presidente da Assembleia Geral. 

Em face da proximidade de posições com a GENI e com a MERCURY e face à impossibilidade de intervenção da PT VENTURES, Isabel José dos Santos detinha o controlo da UNITEL SA, o que lhe possibilitou encaminhar largos milhões de euros da UNITEL, SA, para entidades sob sua esfera.

Isabel dos Santos fez ainda transferir quantias da UNITEL, SA, para a entidade UNITEL INTERNATIONAL HOLDING BV, sociedade com sede nos Países Baixos, constituída a 4/05/2012, registada a 7/05/2012, e, controlada pela própria Isabel dos Santos, sua única beneficiária efectiva. Aquando da sua constituição e até 4/12/2012, indica o despacho do Supremo, a UNITEL INTERNATIONAL HOLDING BV, detinha a denominação social JADEIUM BV.

CELEBRAÇÃO DE CONTRATOS

Com efeito, entre 8 de Maio de 2012 e 28 de Agosto de 2013, foram celebrados sete contratos de financiamento entre a UNITEL SA e a UNITEL INTERNATIONAL HOLDING BV, através dos quais a primeira emprestou à segunda o valor total de 322.979.711,00 euros e 43.000.000,00 dólares, montantes que a UNITEL INTERNATIONAL HOLDING BV, se obrigou a restituir no prazo de 10 anos a contar da data de celebração de cada um dos contratos, conforme demonstra a tabela abaixo.

Isabel dos Santos assinou os referidos contratos de financiamento, na simultânea qualidade de legal representante da UNITEL, S.A., e da UNITEL INTERNATIONAL HOLDINGS B.V. Tais empréstimos permitiram, segundo o Tribunal, a UNITEL INTERNATIONAL HOLDINGS B.V. a aquisição de participações sociais ou a constituição de sociedades no sector das telecomunicações em Portugal, Cabo Verde (UNITEL T) S. Tomé e Príncipe (UNITEL STP, SARL), designadamente a aquisição em Portugal de acções correspondentes a 18,81% do capital social da sociedade comercial portuguesa ZON MULTIMÉDIA SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES E MULTIMÉDIA, SGPS, S.A.

Aquando da fusão, por incorporação da sociedade comercial portuguesa OPTIMUS SGPS, S.A. na ZON MULTIMÉDIA SERVIÇOS DE TELECOMUNICAÇÕES E MULTIMÉDIA, SGPS, S.A., que veio dar origem à sociedade comercial portuguesa actualmente designada por NOS SGPS, S.A., foi criada a sociedade ZOPT SGPS, S.A. que passou a ser titular das acções correspondentes a 52% do capital social da NOS  SGPS, S.A.

No entanto, a UNITEL INTERNATIONAL HOLDINGS B.V. é detentora de acções correspondentes a 32,65% do capital social da ZOPT SGPS, S.A. Verifica-se, atesta o despacho, que a conta em euros da UNITEL INTERNATIONAL HOLDINGS B.V., conta com o IBAN PT50001000004852048150159, recebeu, além do mais, montantes com origem numa conta da mesma sociedade, domiciliada em Amsterdão, no ING BANK, com o número NL28INGB065348141, designadamente: para além disso, a engenheira Isabel dos Santos, por ser beneficiária efectiva da VIDATEL LTD, empresa accionista da UNITEL S.A., só a título de dividendos, foram transferidos para Portugal, cerca de 654 milhões de USD.

Assim, é notório que a UNITEL foi constituída com fundos públicos provenientes da Sonangol e os dividendos que caberiam ao Estado foram pagos à arguida Isabel dos Santos, através da sua empresa VIDATEL LIMITED, permitindo que usasse na constituição de outros negócios.

CRIME DE PECULATO

A Câmara Criminal realça os factos sumariamente descritos indiciam-se os seguintes elementos de prova: documentos provenientes da Sonangol, da UNITEL S.A., Carta Rogatórias provenientes da Holanda e Portugal, tratamento de dados resultante da análise financeira realizada pelo SENRA.

Acrescenta que existem ainda, indícios do crime de peculato, tráfico de influência, participação económica em negócio e branqueamento de capitais, previstos e puníveis, nos termos dos artigos 362.º, 366.º, 364.º do C.P e 82.º da Lei n.º 5/20, de 27 de Janeiro, respectivamente.

Os bens foram arrestados com base na aplicabilidade da medida de garantia patrimonial, tal como resulta da breve descrição factual que antecede, verifica-se que as vantagens do crime apuradas até ao momento ascendem os USD 1.000.000.000 (mil milhões de dólares) que correspondem ao valor das quantias que os arguidos se apropriaram ilicitamente.

Para além deste valor, foram apurados em sede de outros processos-crimes um dano no valor de 1.136.996.825, 56 (mil milhões, cento e trinta e seis milhões, novecentos e noventa e seis mil, oitocentos e vinte cinco dólares norte americanos e cinquenta e seis cêntimos).

Nesta conformidade, inexistindo possibilidade de apropriar as vantagens em espécie, deverão os arguidos ser condenados a pagar ao Estado o respectivo valor dessas vantagens directas, nos termos do artigo 120.º e ss. do C.P.

Para garantia do pagamento de tal valor, apurado nos termos do artigo 120.º e ss. do C,P, determina-se o arresto preventivo dos bens que este possua no seu património, nos termos do artigo 9.º da Lei 15/18, de 26 de Dezembro.

Esta medida deverá ser aplicada de imediato e sem prévia audição dos visados. Pois, quanto à necessidade de aplicação das medidas de garantia patrimonial sem prévia intervenção do visado afirma o Acórdão do Tribunal de Justiça de Portugal (Grande Secção) 21 de Dezembro de 2011 (proferido no processo C-27/09 P) que “Com efeito, para uma medida desse tipo não comprometer a sua eficácia, deve, pela sua própria natureza, poder beneficiar do efeito surpresa e ser aplicada imediatamente”.

A aplicação do arresto preventivo não está sujeita aos requisitos gerais consagrados no art. 286.º do CPP. Na medida em que, a Lei n.º 15/18, de 26 de Dezembro refere no art. 9.º n.º 3 que o arresto é decretado pelo Juiz. 

Fonte: JA

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