As CPIs são de iniciativa dos Grupos Parlamentares e a falta de consenso no Parlamento tem levado ao bloqueio da maior parte das iniciativas da oposição, uma anomalia política, segundo analistas.
A Assembleia Nacional aprovou apenas a constituição de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) ao longo dos últimos 32 anos, desde o estabelecimento do multipartidarismo no País, sendo que outras cinco iniciativas, todas da UNITA, foram bloqueadas pela maioria parlamentar.
As CPIs são um instrumento político do Parlamento, que visa a fiscalização dos actos e as actividades do Poder Executivo, da administração pública e das demais instituições públicas.
A primeira CPI de iniciativa do maior partido na oposição surgiu em 2012 e referia-se ao clima de intolerância política na província do Huambo, sendo a única que realmente avançou, contando com os votos da maioria da Assembleia Nacional para o efeito.
De lá para cá, foram submetidas outras cinco, também pelo grupo parlamentar do maior partido da oposição, mas acabaram por “bater na trave” da maioria de votos da AN. Especialistas ouvidos pelo Expansão lamentam a falta de abertura no Parlamento para a fiscalização e investigação das acções do Executivo, e não só, algo que contribuiria para o aumento da transparência e da confiança na governação e nas instituições do Estado. O coordenador do Observatório Político Social Angolano (OPSA), Sérgio Calundungo, considera uma “anomalia da nossa cultura política” não só o bloqueio sistemático das CPIs, mas também o número escasso de submissão destes instrumentos de fiscalização, que deveriam servir para se apurar a verdade e trazer a verdade material dos factos. “Se reparar, grande parte das CPIs incidem sobre o Executivo, então não estou a ver um partido como o MPLA aceitar muitas CPIs contra o seu próprio Executivo. Muito pelo contrário, ele vai bloqueando as possíveis que surgirem”, disse lembrando que os deputados prestam obediência ao Presidente da República, que é Titular do Poder Executivo e por isso não se pode esperar grandes aberturas no parlamento a favor da oposição.
No entanto, Calundungo nota que mesmo os Grupos Parlamentares sabendo que os pedidos para a constituição de CPIs vão ser, à partida, inviabilizados, deveriam tornar o assunto um debate nacional para que a sociedade saiba o que se passa no Parlamento, coisa que não acontece.
Já o director-executivo do Instituto Angolano de Sistemas Eleitorais e Democracia (IASED), Luís Jimbo, entende que há aqui uma solidariedade muito forte do Grupo Parlamentar do MPLA para com o Executivo na tomada de decisões que venham a dar uma percepção de má governação. “A verdade é que estamos numa maturidade política em que o MPLA, que sustenta a maioria parlamentar e suporta o Executivo, estará sempre contra a constituição de CPIs, que comprometam o Presidente da República na qualidade de chefe do Executivo”, sublinha.
Luís Jimbo diz mesmo que para efectivação das CPIs, o País tem de continuar a pensar em sistemas políticos mais eficientes que respondam à nossa realidade. Ou seja, uma governação que usa todo o poder político para satisfazer e realizar as necessidades do povo e não para resolver o problema de um grupo ou combater outros grupos como acontece nos dias de hoje.
Com isto, adianta, a política fica concentrada numa oligarquia e num monopólio de interesse de grupos que se esquecem da maioria e é isso que acontece na nossa política doméstica, na “qual os valores políticos não estão alinhados com os valores da sociedade”.
Ainda assim, Luís Jimbo afirma que a oposição pode exercer mais pressão dentro do Parlamento para a constituição de mais CPIs. Nesse sentido tem também de aumentar a sua capacidade de investigar, tratar e analisar os factos.
O reduzido número de CPIs , que são uma forma de o Poder Legislativo exercer a sua função fiscalizadora, acaba por “bater” também com a fraca produção de todos os partidos no Parlamento no que diz respeito à apresentação de propostas de lei.
Em sete anos, os vários partidos que têm tido assento parlamentar apenas submeteram 22 propostas de lei. Isto porque o grosso das propostas de lei aprovadas na Assembleia vêm do próprio Executivo. Entre CPIs e propostas de lei, o papel dos partidos na AN deixa muito a desejar.
E se o partido do poder acaba por remeter para o Executivo esse papel, os partidos com assento parlamentar acabam por ficar mal nesta “fotografia”, já que as propostas de lei são instrumentos utilizados pelas oposições da maioria das democracias para fazer oposição aos governos.
A imprensa contactou o vice- -presidente do grupo parlamentar do MPLA que não se mostrou disponível para abordar o tema das CPIs. Por outro lado, o presidente do grupo da UNITA, Liberty Chiyaka, considerou uma falta de respeito democrático inviabilizar a discussão de assuntos importantes da nação e relevantes para a opinião pública, escusando-se a comentar outros assuntos.
Fonte: Expansão