A instituição é mais pessimista face ao cenário avançado pelo governo a 27 de Março, que prevê um crescimento de 3,01%. Para o sector não petrolífero o Fundo prevê um aumento de apenas 2,7% em 2024, enquanto o governo aponta a 5,3%. O relatório de avaliação do FMI avança também com uma série de recomendações que diz ser imperativo aplicar.
Foi publicado o último relatório de avaliação pós-financiamento de Angola do FMI, onde a instituição refere que o País mostrou resiliência em 2023, apesar da queda do preço do petróleo e da sua produção, responsabilizando as reformas económicas iniciadas no decorrer do Programa de Financiamento Alargado 2010-2021 por este facto, nomeadamente nas áreas da gestão orçamental, mobilização de receitas, gestão da dívida pública, política monetária e estabilidade financeira. Conclui nesta lógica que “a capacidade de reembolso de Angola é adequada na medida em que os riscos são controláveis. No cenário de base, projecta-se que os reembolsos de Angola ao FMI aumentem a médio prazo, atingindo o seu valor máximo em 2026”.
Passada a introdução, o relatório do FMI deixa recados importantes ao governo angolano porque a situação não é boa, “as perspectivas de base são favoráveis, embora os riscos permaneçam inclinados para o cenário negativo”, lê-se no documento. Entre os riscos de deterioração das perspectivas económicas para o País, são destacadas a diminuição da produção interna de petróleo ou a queda significativa dos preços internacionais, derrapagens na reforma dos subsídios aos combustíveis e repercussões negativas dos mercados internacionais de capitais.
Com uma linguagem em crescendo, o documento refere que “é fundamental racionalizar as despesas a curto prazo e prosseguir a reforma dos subsídios aos combustíveis (com medidas de mitigação que visam apoiar os mais vulneráveis e uma estratégia de comunicação proativa). As autoridades devem igualmente aumentar as reservas de capital, através da adopção de medidas de política fiscal que permitam mobilizar receitas internas não petrolíferas e progredir na agenda de reformas estruturais das finanças públicas, incluindo em matéria de gestão das finanças públicas e do investimento público”.
Em termos práticos, isto significa que o País tem de cortar nas despesas da sua Administração Pública, nomeadamente nas benesses e benefícios que estão completamente desajustadas da nossa realidade, e prosseguir com a retirada gradual dos subsídios dos combustíveis ao longo deste ano, desenvolvendo em contrapartida programas especiais de apoio para sectores como os transportes, agricultura e pescas. Deve igualmente aumentar as receitas tributárias do sector não petrolífero, nomeadamente com a formalização da actividade económica informal, que vale mais de 80% do total, uma percentagem demasiado elevada para garantir o desenvolvimento económico de Angola. Estas receitas só poderão crescer com o aumento da base tributária e não com uma maior carga fiscal aos que já pagam, nem se resolve com uma postura predatória que acaba por empurrar mais operadores para a informalidade.
No que se refere à retirada dos subsídios aos combustíveis, José Oliveira defende que “houve um atraso grande nesta questão e hoje o País não tem capacidade para resolver a questão de uma forma rápida, até porque a economia não tem capacidade para absorver uma subida dos preços em grande escala. O que defendo é que isso se faça por degraus, retiradas de seis em seis meses com aumentos entre os 15 e 20% até chegarmos aos preços de mercado”. Diga-se também que, verdadeiramente, o Estado não tem capacidade para proteger os mais vulneráveis como sugere o relatório, nomeadamente em sectores como o dos transportes, agricultura, as pescas ou a indústria.
É feita também uma chamada de atenção clara à necessidade de fazer reformas estruturais nas finanças públicas, fundamentalmente em dois campos – na gestão correcta da aplicação do dinheiro disponível e na qualidade dos investimentos públicos, que devem respeitar o princípio de ter impacto real na economia e na qualidade de vida dos cidadãos.
Neste aspecto da contenção e gestão das despesas, as críticas são recorrentes e mantêm-se ao longo dos anos. “Das piores coisas que o Estado tem feito é gastar à toa em todos os sentidos”, começa por referir o economista Heitor de Carvalho, que concretiza: “Tem de se cumprir as despesas que estão no OGE e não outras que se vão fazendo ao longo do ano. Não pode ser isso de sonhar, acordar e avançar para novos projectos. Os que estão no OGE, que foram pensados por especialistas, é que são para cumprir”.
Fonte: Expansão