
O Presidente da União Africana, João Lourenço, assinalou, ontem, no Rio de Janeiro, Brasil, que a “boa relação” existente entre o continente berço e os BRICS reflecte o caminho conjunto para o fortalecimento do Sul Global, com vista ao estabelecimento de parcerias mutuamente vantajosas.
O reconhecimento foi expresso durante a 17.ª Cimeira deste Grupo, na qual o Chefe de Estado angolano destacou, entre as parcerias, o desenvolvimento sustentável e a redução das desigualdades, em meio aos desafios globais cada vez maiores.
No evento em que participam o Primeiro-Ministro da Índia, Narendra Modi, e o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, em representação do Presidente Vladimir Putin, o Presidente João Lourenço referiu que África estruturou a sua própria estratégia de desenvolvimento, plasmada na conhecida Agenda 2063 da União Africana, onde estão definidos os principais vectores destinados a impulsionar o desenvolvimento do continente, para que a interacção com as instituições financeiras dos BRICS ajude a alavancar as economias africanas, mormente no que diz respeito ao investimento em infra-estruturas que conduzam à electrificação, industrialização e implementação da Zona de Livre Comércio Continental Africana (ZCLCA).
“Temos plena consciência de que estamos diante de um desafio incontornável, o qual teremos de enfrentar e vencer para realizarmos o objectivo da inclusão de África na economia mundial com contributos significativos para a resolução dos problemas que o mundo enfrenta, como os da crise alimentar e energética”, disse.
O Líder da União Africana destacou a relação do Brasil com o continente, pelo facto de este manter vínculos sólidos e históricos que remontam há séculos e lhe confere uma sensibilidade muito especial para com as preocupações dos africanos, sendo, por isso mesmo, um forte aliado nesta organização, da qual vai assumir a presidência a partir de agora.
Apelo ao fim das guerras em meio a incertezas
João Lourenço reconheceu que a Cimeira dos BRICS no Rio de Janeiro acontece num momento bastante conturbado e de grandes incertezas quanto ao futuro do Planeta, devido às guerras, conflitos e o terrorismo que proliferam pelos diversos continentes.
“Advogamos a resolução pacífica dos conflitos pela via negocial, apelando ao fim das guerras entre a Rússia e a Ucrânia que ameaça a paz na Europa, ao fim do conflito entre a RDC e o Rwanda, conflito que há décadas desestabiliza os países da vasta e rica região dos Grandes Lagos, preocupa-nos a situação do Sudão e o alastramento do terrorismo na região do Sahel e no Corno de África, e na Somália em particular”, enfatizou.
O Presidente da União Africana defendeu, também, o fim do genocídio do povo palestino na Faixa de Gaza e dos Colonatos, bem como a necessidade do cumprimento das resoluções do Conselho de Segurança das Nações Unidas sobre a urgência da criação do Estado da Palestina.
“Aplaudimos todas as iniciativas que concorram para se evitar o alastrar do conflito no Médio Oriente, que deve ser uma região de prosperidade e bem-estar para os seus povos e nações. Acredito que neste domínio, os BRICS devem colocar-se numa posição de fazer valer a observância das regras que regem as relações internacionais, conferindo primazia ao diálogo e ao entendimento na base do respeito pelos princípios da Carta das Nações Unidas”, sustentou o Estadista angolano.
O Presidente João Lourenço referiu que as nações do mundo têm lidado há décadas com instituições de governação global criadas após a Segunda Guerra Mundial, mas com as profundas mudanças que se vêm registando nestas oito décadas passadas, precisam ajustar-se às novas realidades, um esforço cujos resultados estão muito aquém das expectativas da maioria global e relativamente ao qual parece não haver ainda sensibilidade suficiente.
Neste particular, o Presidente da União Africana acredita que os BRICS podem ter um desempenho relevante e actuante no sentido de se construir um maior equilíbrio na discussão sobre os temas referentes à governação mundial, entre o Sul Global e os países desenvolvidos.
João Lourenço defende, para tal, a necessidade urgente de trabalhar com o objectivo de se alcançar o fortalecimento do multilateralismo, cada vez mais ameaçado nos tempos que correm e por constituir um factor de instabilidade e de desencadeamento das tensões com que o mundo se depara um pouco por todo o planeta.
Ordem económica mundial
Na intervenção que teve lugar ontem à noite, o Chefe de Estado angolano sublinhou que os BRICS têm, neste contexto, um campo de intervenção decisivo e fundamental para que se reequilibre a abordagem relativa à ordem económica mundial, em que sobressaem as questões que dizem respeito ao comércio assente sobre bases mais justas, ao investimento e ao financiamento em moldes menos onerosos para os mais necessitados.
O Presidente da organização continental considerou o palco da Cimeira dos BRICS apropriado para se abordar e trocar ideias sobre o potencial de que o Sul Global dispõe para “ampliarmos e aprofundarmos a cooperação multilateral, na perspectiva de desenvolvermos parcerias sólidas que ajudem a fomentar o desenvolvimento social e económico dos nossos respectivos países”.
Reconheceu que fazem parte da estrutura fundacional do Grupo países de diferentes regiões do planeta com visões, experiências e orientações de natureza política distintas, sublinhando que a união se deu em torno de aspirações comuns, longe da lógica da confrontação e da imposição de interesses próprios, por forma a que actuem dentro de um quadro de convergência de prioridades e de objectivos voltados para a resolução dos graves problemas ligados à pobreza, às desigualdades e a um sem número de carências que afectam a vida de uma grande parte da população mundial.
“Não posso deixar de dizer que as nações do Sul Global têm clamado ao longo de décadas pela sua inclusão na discussão e nas decisões que são tomadas a respeito da criação de factores de desenvolvimento justos, equilibrados e capazes de atender às suas preocupações fundamentais, sem que tenham conseguido ser ouvidos plenamente”, sustentou.
O líder da União Africana referiu, ainda, que “sentimos que estamos agora diante de uma possibilidade real, ao nível dos BRICS e das suas instituições, de podermos falar sobre o financiamento para o desenvolvimento de África e das infra-estruturas de que necessita, para corresponder mais cabalmente aos desafios que enfrenta, de modo a transpor os obstáculos que condicionam a realização de projectos essenciais na área da Agricultura, da Saúde, da Educação, da Ciência e da Tecnologia, da Energia, dos Transportes, das Telecomunicações e outros”.
Quanto aos sectores acima referidos, João Lourenço disse constituírem pilares essenciais para o desenvolvimento das nações africanas e por forma a dar-lhes maior destaque, a União Africana decidiu, em Fevereiro deste ano, realizar uma grande conferência subordinada ao tema “Infra-estruturas como Factor de Desenvolvimento em África”, a ser realizado em Outubro deste ano, em Angola, “com o propósito de atrair parcerias interessadas em envolverem-se com a Organização, num quadro de vantagens mútuas, na concretização deste grande sonho dos africanos”.
Fonte: JA